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"Fiz um programa de TV, a Supernanny, que me atirou para a odiolândia"

Estivemos à conversa com a psicóloga Teresa Paula Marques, que se tornou conhecida do público enquanto Supernanny.

"Fiz um programa de TV, a Supernanny, que me atirou para a odiolândia"

'Odiolândia': eis o nome do novo livro da psicóloga Teresa Paula Marques. Trata-se de um projeto que aborda uma realidade cada vez mais proeminente nas nossas vidas, as redes sociais. Porque é que as críticas e as polémicas são tão comuns hoje em dia? De onde vêm os haters, 'odiadores' em português, e porque é que insistem na crítica e na ofensa gratuita?

Foi a estas perguntas que a autora tentou responder, até porque ela mesma já foi vítima destes ataques devido ao programa da SIC 'Supernanny', que gerou em 2018 uma enorme controvérsia. 

Como é que chegou a este título?

Confesso que foi inspirado numa autora norte americana que numa palestra falou da cidade do ódio e eu associei logo - uma 'odiolândia'. Nunca tive dúvidas que seria este o título do livro. 

Porquê a escrita do livro agora?

Terminei o meu doutoramento em Psicologia da Educação há quatro anos e já foi sobre redes sociais, o Facebook: os riscos, os benefícios, bem como o impacto do online no offline. Já havia esse interesse prévio enquanto investigadora. E [também] depois por me ter visto num outro papel, não só o da investigadora que olha para o fenómeno, mas também o da pessoa que de repente o está a viver, que é um dos riscos das redes sociais. Ou seja, o facto de ter feito um programa de televisão que me atirou para a 'odiolândia', na qual eu vivi um ano.

Houve ainda outra necessidade, nomeadamente a de procura de sentido para isto. A teoria é uma coisa, a prática é outra. Como é que é possível que alguém que não nos conhece de lado nenhum, nunca nos viu, nunca falou connosco, nos ofende e insulta? A que propósito? Quis procurar explicações na ciência também. 

Estreou o programa, estava tudo muito alegre, no dia seguinte foi como um tsunami que caiu em cima de mimEm relação à 'Supernanny', estava à espera da reação que houve na época?

Não estava à espera. Estava à espera de polémica. Estreou o programa, estava tudo muito alegre, no dia seguinte foi como um tsunami que caiu em cima de mim. Estava à espera de críticas? Estava. Há sempre pessoas que gostam e outras que não. Respeito que as pessoas não tenham gostado, agora, isso não lhes dá o direito de arranjarem um bode expiatório e desviarem o foco das críticas para mim.

Não posso perder a noção de que não fiz mal a ninguém, porque querem fazer-nos acreditar que somos uns monstros.Como é que se recuperou após a polémica?

Uma das estratégias é enfrentar a situação. Nunca deixei de fazer a minha vida normal, de ir trabalhar, ir ao centro comercial, etc. Apoiei-me também nos meus amigos. Cheguei a um ponto em que pensei: não posso perder a noção de que não fiz mal a ninguém, porque querem fazer-nos acreditar que somos uns monstros.

O programa foi mesmo interrompido na altura?

Sim. Gravei sete episódios e só dois foram para o ar. As famílias desses dois episódios ainda se dão comigo. Estávamos todos estupefactos com aquilo. Tanto que depois comecei no 'Queridas Manhãs' e todos os dias tinha comentários de haters. Também chegaram a pôr em causa as minhas qualificações académicas e isso magoou-me.

Aquilo por que passou é a prova em como o mundo na Internet e o mundo cá fora se influenciam mutuamente?

Não existem dois mundos separados. Não se pode pensar: 'Isto é numa rede social, não tem problema'. Não, está-se a atacar uma pessoa. Temos de ser empáticos com os outros. Temos de perceber que ficam com aquele sentimento de injustiça. Percebi falando com figuras públicas que há quase um certo encolher de ombros, mas não pode haver. Houve alguns que me disseram que quem tinha haters é porque era importante, mas não podemos medir o nosso nível pelo número de haters. 

Há os outros, os 'sincericidas', que acham que têm de dizer tudo sem filtro e que isso é uma coisa muitíssimo boa e até uma qualidade da sua personalidade... que não é!

Em relação aos haters... essas pessoas têm consciência de que são assim ou para elas o que dizem não passa de opiniões?

Há uns que realmente estão convictos de que podem dar a sua opinião da maneira que lhes assiste. Um insulto nunca pode ser o exercício de uma liberdade de expressão, porque estamos a invadir a liberdade do outro e a causar mal-estar. Depois há os outros, os 'sincericidas', que acham que têm de dizer tudo sem filtro e que isso é uma coisa muitíssimo boa e até uma qualidade da sua personalidade... que não é! Quem diz tudo ou são as crianças, porque ainda não têm maturidade, ou os loucos, que não têm sanidade mental. Não é uma qualidade, mas sim uma grande falta de educação. Há pessoas, contudo, que fazem isto de propósito para conseguirem mais polémica e mais cliques. 

Como aquelas 'celebridades' que aproveitam para se promover através das polémicas?

É o negócio do ódio. Há pessoas que sabem à partida o que acontecerá se colocarem fotografia X numa rede social. Já foram várias vezes alvo de polémicas por causa daquele tipo de fotografias e vão pôr outra vez. Claro que é um direito que lhes assiste, mas não sejamos ingénuos, não é por acaso. É porque sabem que vão gerar grande polémica. Se colocarem coisas levezinhas ninguém vai lá ver ou odiar. Passa a ser desinteressante. 

Mas há outras figuras cujo ódio é constante. Veja-se o exemplo da Cristina Ferreira.

É uma das pessoas mais odiadas. Quando vemos uma foto dela com uma determinada roupa sabemos perfeitamente que aquilo é para dar espetáculo. Quem não percebe isso, não percebe nada. Eu poderia pensar: 'Não vestiria isso'. Poderia comentar e dizer que não gostava muito da roupa, isso é liberdade de expressão. Agora dizer que 'parece esta ou aquela', não, isso não. 

Nunca na cara da Cristina Ferreira diriam para ela morrer

Há pessoas que chegam mesmo a dizer que gostavam que o outro morresse. O que leva uma pessoa a dizer isso do ponto de vista da Psicologia?

É a sensação de anonimato total. Reage-se ao outro como se fosse um objeto sem sentimento. Nunca na cara da Cristina Ferreira diriam para ela morrer, por exemplo. É necessária uma intervenção ao nível dos mais novos. Há muita falta de empatia entre as pessoas. Não se colocam no lugar do outro, não sentem o que o outro sente e quem não tem uma boa autoestima começa a interiorizar os insultos.

Há muitos estudos que apontam que os haters sofrem de tríade negra: características de psicopatia, maquiavelismo e narcisismoMas uma pessoa que fala em anonimato acaba por mostrar aquilo que realmente é uma vez que ninguém conhece a sua identidade. Isto não é um sinal de preocupação?

As redes sociais são um campo fértil para a patologia germinar. Há muitos estudos que apontam que os haters sofrem de tríade negra: características de psicopatia, maquiavelismo e narcisismo. Estas três características de personalidade são terríveis, estas pessoas são perturbadas, mas nem todos são assim. Esta é uma franja da população. 

Depois há outros. Os invejosos, costumo dizer que sofrem imenso. Uma coisa é termos pena de não sermos donos de tantos carros como o Ronaldo, outra é achar que eles não os deveria ter. Desejar-lhe que acontecesse alguma coisa para ele os perder. O invejoso está constantemente a destruir com palavras aquilo que o outro construiu. Relaciona tudo com fatores exteriores - sorte, cunha, meteu-se com alguém - nunca com fatores internos, como o trabalho e esforço pessoal.

Há sempre a tendência de olhar para o lado negativo também.

Sempre! Mas eu penso de outra maneira. Em relação à Cristina Ferreira, ela está sempre a trabalhar. Deve ter um casarão e não usufrui dele. Tem um filho e tem de andar sempre a correr para estar com ele. É um ser humano. 

Porque é que as redes sociais têm um papel tão importante na vida das pessoas?

Vivemos numa sociedade de informação. Antes a informação só estava disponível nas bancas dos jornais ou na televisão, neste momento está na palma da nossa mão. Estudos mostram que não existem dois mundos separados - o online separado do offline, é um contínuo. Aquilo que há muitos anos víamos nos filmes, metade máquina, metade humano, neste momento, funcionamos assim. Sou do tempo em que não havia telemóveis e nós também vivíamos e vivíamos bem. Criou-se esta necessidade de estarmos constantemente informados e às vezes mal informados.

Considera que as coisas vão melhorar ou piorar?

Sou otimista, acho que vão melhorar. Vão melhorar a bem ou a mal, é necessária uma legislação acerca destas questões. Muitos dos casos nunca são punidos, mas há alguns casos que estão a começar a ir tribunal, porque é preciso ter noção, isto não é uma terra de ninguém. 

Mas aí não há a possibilidade de pecar por excesso?

Sim, mas há coisas básicas nos relacionamentos das pessoas que não podem continuar a ser assim. Há um trabalho a ser feito a ser com os jovens, que é o futuro. A sensibilização para este fenómeno, tem de ser um trabalho quase diário nas escolas. Para os jovens é devastador, porque não têm ferramentas para lidar com as coisas. O ódio vai tender a aumentar mas a sensibilização poderá fazer com que haja aqui uma mudança a partir de certa altura. 

Leia Também: "Não sou a psicóloga a que as pessoas vão só lá conversar, dar colinho"

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