Argentina transfere para Brasil presidência de um Mercosul em tensão

A Argentina passa hoje ao Brasil a presidência semestral do Mercosul, num movimento que significa uma mudança de uma agenda mais protecionista para uma de maior abertura comercial, ponto central do choque que ameaça fraturar o bloco sul-americano.

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Lusa
08/07/2021 10:59 ‧ 08/07/2021 por Lusa

Economia

Mercosul

 

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"O Uruguai comunicou que começará a conversar com países terceiros para negociar acordos comerciais fora do Mercosul. A posição uruguaia consiste em defender a modernização do bloco, através de uma agenda de negociações externas", avisou, em nota, o Ministério das Relações Exteriores uruguaio durante a reunião de chefes da diplomacia que, nesta quarta-feira (07), antecedeu a Cimeira do Mercosul (Mercado Comum do Sul).

Com a ajuda do Uruguai, o Brasil promete pressionar pela modernização do bloco, isto é, pela flexibilização das atuais regras que mantêm as tarifas mais altas do mundo e a proibição de que um dos sócios negocie individualmente tratados de comércio livre com outros países e blocos.

Pelas atuais regras, todos os países precisam de negociar em conjunto e aprovar as decisões por consenso entre os quatro fundadores: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

"O Uruguai entende que a decisão 32/00 não está em vigor porque nunca foi internalizada", esclareceu na nota o governo uruguaio.

A resolução 32, aprovada em 2000, proíbe a negociação individual de acordos com países de fora do bloco. A Argentina, com o apoio do Paraguai, entende que uma flexibilização dessa regra seria o fim do Mercosul como união alfandegária.

"A Argentina está convicta de que o Mercosul é a principal plataforma para a inserção no comércio mundial e que a ação conjunta e por consenso são as chaves para essa inserção", defendeu o ministro dos Negócios Estrangeiros argentino, Felipe Solá, em resposta ao Uruguai.

Brasil e Uruguai veem na posição argentina a estratégia de exercer um poder de veto para impedir as negociações com os países e blocos mais competitivos.

Outro foco de colisão com a postura argentina é a Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, considerada a mais alta do mundo, numa média de 12,5%, enquanto a média mundial está em 5,5%.

A TEC é a barreira tarifária que o Mercosul impõe aos produtos e serviços de fora do bloco. Essa barreira funciona como uma proteção da produção local contra os importados, mas, quando elevada, também impede a competitividade.

"Não foi aprovada uma redução da TEC, apesar de o Uruguai apoiar algumas das propostas apresentadas. O Uruguai entende que essa redução forma parte de um mesmo pacote de flexibilização", indicou a nota da diplomacia uruguaia.

O Brasil quer uma redução imediata de 10% em todas as tarifas e outros 10% dentro de seis meses, também de forma generalizada. Esse objetivo tem o apoio do Uruguai e do Paraguai, mas é rejeitada pela Argentina, que quer proteger a sua indústria de mão-de-obra intensiva.

Contrária à entrada de importados, a Argentina aceita diminuir apenas 10% da TEC dentro de seis meses, mas somente em 75% dos seus produtos, deixando de fora setores como automóveis, laticínios, brinquedos e têxteis.

Além de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, participam na cimeira virtual de hoje o Chile, como país associado, e a Bolívia, país em processo de adesão ao bloco.

Os presidentes farão os seus discursos, que, pela primeira vez, por decisão do Governo argentino, serão fechados sem a habitual transmissão, numa evidência do choque ideológico entre os países do bloco.

Na última reunião, em 26 de março, em comemoração pelos 30 anos do Mercosul, ficou evidente a tensão em torno da abertura comercial tanto pela redução da TEC quanto das regras para negociações com outros países e blocos.

"Queremos que o Mercosul seja um trampolim; não uma camisa-de-força nem um lastre", pediu o Presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou. "Se somos um lastre, que desçam do barco, tomem outro barco", respondeu o homólogo argentino, Alberto Fernández.

Na reunião de hoje, a Argentina vai destacar avanços durante a sua presidência na revisão legal dos acordos fechados em 2019, mas ainda pendentes de ratificação, com a União Europeia e com a EFTA (Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein). Também vai apontar as negociações em andamento com Canadá, Coreia do Sul, Singapura e Líbano, mas que foram lançadas há anos.

Como novidade, a Argentina vai contabilizar o lançamento de negociações com a República Dominicana e com El Salvador, além de um incipiente diálogo exploratório com a União Africana e com a Indonésia.

Para Brasil e Uruguai, os avanços foram insuficientes e com mercados de menor peso no contexto global.

Leia Também: Brasil assume presidência rotativa do Mercosul em cimeira

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