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"A literacia financeira é um dos pilares mais importantes na nossa vida"

Vítor Pinheiro trabalha como IT business manager no Emirates NBD e mora no Dubai há cerca de três anos. É natural de Braga e tem uma relação próxima com temas que envolvem os mercados financeiros e as finanças pessoais. Numa conversa com o Notícias ao Minuto, Vítor revela que as pessoas devem investir, mas com 'regras'.

"A literacia financeira é um dos pilares mais importantes na nossa vida"

Vítor Pinheiro tem 30 anos e desde cedo começou a interessar-se pelo mundo dos mercados financeiros e das finanças pessoais, sempre com o foco em alcançar a liberdade financeira. Agora, trabalha como IT business manager no Emirates NBD e mora no Dubai há cerca de três anos. 

À parte disso, Vítor criou um canal no YouTube - o Mais Foco - onde partilha ideias e conhecimento sobre investimentos, produtos financeiros  e outros temas relacionados com a banca.  

Natural de Braga, Vítor diz que é um erro olhar para os mercados financeiros como uma "forma de enriquecer rapidamente". Contudo, defende que as pessoas devem investir, de forma informada e em segurança, desde cedo, e "se têm pouco dinheiro" sugere que "invistam nelas próprias".

Em entrevista ao Notícias ao Minuto, Vítor sublinha a importância da literacia financeira, comparando também as duas realidades entre Portugal e o Dubai. Vítor revela ainda qual é a 'chave' para "reduzir o risco" e manter a "estabilidade emocional e financeira": a diversificação.

O último vídeo que publicou no YouTube fala sobre investir em PPR. Acha que as pessoas têm conhecimento suficiente sobre os produtos de investimento que existem atualmente? 

Acho que não. Creio que as pessoas estão habituadas a produtos ainda mais conservadores como certificados de aforro se compararmos com um PPR, muito pelo que os banco publicitam, pois estes normalmente fazem campanhas para as pessoas subscreverem todos os anos e pelo facto de o nosso governo incentivar o investimento ou a poupança através destes. 

Do meu ponto de vista, em Portugal somos muito conservadores no que toca a investir. E podemos constatar isso com a percentagem de pequenas e médias empresas que anda à volta de 99% do total de empresas, em que microempresas são 95%. Isto demonstra que ou não há interesse em criar mais riqueza, ou as pessoas não querem correr riscos com medo de falhar, ou há demasiados entraves por parte do Governo, seja em impostos ou burocracia.

Se eu não quiser investir na minha própria empresa, por que não recorrer aos mercados de capitais e investir em empresas que já são bem sucedidas?

Como nasceu esse gosto pelos mercados? 

O meu gosto começou ainda numa altura que me juntava no café com amigos e falávamos de apostas desportivas como forma de um rendimento extra. Passei mais tempo a ver jogos desportivos e a apostar, do que a apender sobre formas de poupar ou investir. Comecei a ler mais sobre negócios e empresas bem sucedidas e todas tinham uma coisa em comum: os investidores. Toda a gente pensa que grandes negócios vieram de grandes ideias e, em parte é verdade, no entanto, sem investidores ou acesso a mercados de capitais, esses negócios não seriam os gigantes que são hoje. Isto é bom para as empresas, para os investidores, para governos e os cidadãos, que beneficiam também com postos de trabalho e salários mais atrativos.

Comecei a dedicar ainda mais tempo, quando aprendi conceitos como inflação, desvalorização da moeda ou juro composto, que tenho vindo a falar no meu canal do YouTube. Isso foi o que realmente mudou a minha forma de investir, pois até aí eu não tinha percebido que deixar o dinheiro debaixo de colchão ou numa conta bancária que paga 0% de juros era um dos piores erros que podemos cometer. Em que a inflação é apenas mais um imposto que os bancos centrais ou governos aplicam nos seus cidadãos, pois reduz o nosso poder de compra a longo prazo, mas também é uma ferramenta muito potente de eliminar/reduzir dívida boa (por exemplo, crédito habitação com juros baixos, que usamos para comprar um ativo que aprecia com o tempo).

O que pude notar, é que, realmente, aqui há profissionais de todo o mundo, com diferentes realidades que trazem conhecimento valioso de fora

O seu percurso profissional levou-o até ao Dubai, local onde mora atualmente. Como descreve a experiência de trabalhar num banco nos Emirados Árabes? As realidades são muito diferentes? 

A minha experiência está a ser muito positiva e, sim, as realidades são muito diferentes. Primeiro, continuo a acreditar que temos grande talento em Portugal, o nosso ensino universitário e empresas são bons e isso é reconhecido além-fronteiras. Em segundo lugar, os métodos de trabalho em Portugal estão a par com formas de trabalhar em grandes multinacionais e, em terceiro, temos uma adaptação incrível. O que pude notar, é que, realmente, aqui há profissionais de todo o mundo, com diferentes realidades que trazem conhecimento valioso de fora. Não só a organização ganha com isto, como também nós.

Depois, o investimento em tecnologias emergentes foi algo que me deixou surpreendido, pois aqui a capacidade de inovar é muito grande, é um mercado competitivo. Portanto, juntamos a vontade da empresa de inovar, com o acesso a capital necessário para que isso aconteça, que se calhar, em Portugal, é a área onde empresas estão mais constrangidas.

O mais desafiante é o fator psicológico. Olhar para o valor dos nossos investimentos a subir e a descer mexe muito com os nossos sentimentos, causando até desespero quando desce ou uma euforia quando sobe

A partir do Dubai faz vídeos, em português, para o YouTube sobre finanças pessoais e investimento. Considera que a literacia financeira é importante?

A literacia financeira é um dos pilares mais importantes na nossa vida. Infelizmente, no nosso dia a dia, fazemos centenas de decisões algumas conscientes outras inconscientes sobre dinheiro. 'Compro este produto ou aquele?', 'Comprámos ou arrendamos um apartamento?', 'Vamos colocar o nosso filho num explicador?'. Estamos sempre a ponderar variáveis numa balança e, na maior parte dos casos, dinheiro é a variável mais importante.

No entanto, sempre que queremos falar do assunto dinheiro ou literacia financeira, parece que a mensagem [que passa] é que queremos enriquecer facilmente ou que só pensámos em dinheiro, mas sempre com uma conotação negativa associada.

Acho que o 1% de pessoas ricas em Portugal saberá falar tudo e mais alguma coisa sobre literacia financeira e o resto [das pessoas] apenas tem uma introdução básica de como esticar o salário mensal para conseguir pagar todas as despesas e viver com algum conforto.

Saber como lidar com dinheiro seja para poupança ou investimento, saber porque é que pagamos os impostos que pagamos, saber como preencher um IRS para além do básico deve estar na agenda do ensino em Portugal. 

Nunca devemos olhar para os mercados financeiros como uma forma de enriquecer rapidamente e nunca devemos colocar 100% dos nossos investimentos no mesmo sítio

O que é que é mais desafiante, do seu ponto de vista, nos mercados financeiros? 

O mais desafiante é o fator psicológico. Olhar para o valor dos nossos investimentos a subir e a descer mexe muito com os nossos sentimentos, causando até desespero quando desce ou uma euforia quando sobe.  Eu perdi isso com o tempo, sou muito mais calmo agora, pois percebi que isto são tudo investimentos a longo prazo. Nunca devemos olhar para os mercados financeiros como uma forma de enriquecer rapidamente e nunca devemos colocar 100% dos nossos investimentos no mesmo sítio. Diversificação é a chave para reduzir o risco e manter a nossa estabilidade emocional e financeira.

Como é óbvio, tem de haver um conhecimento financeiro mínimo sobre os produtos e empresas existentes, mas não olho isso como um fator desafiante, há produtos como ETFs ou Exchange Traded Funds ou PPRs, que retiram a necessidade de ter um conhecimento financeiro vasto, em que estamos a investir num leque bastante variado de produtos financeiros. Isso, sim, acredito que sejam os melhores veículos para desfrutar de um rendimento totalmente passivo, para qualquer tipo de carteira. 

Ter precaução e um fundo para cobrir as despesas mensais em caso de perda de emprego, ou outra situação inesperada, é fundamental para uma boa gestão de risco

Qualquer pessoa pode investir? Ou deve ter aconselhamento e uma ‘almofada’ de capital confortável?

Qualquer pessoa deve investir! Quanto mais novo, melhor. Ter muito dinheiro parado a render menos que a inflação, na minha opinião, é um mau investimento. Ter precaução e um fundo para cobrir as despesas mensais em caso de perda de emprego, ou outra situação inesperada, é fundamental para uma boa gestão de risco.

Com o crescente interesse por parte das pessoas em investir, também veio o crescente interesse de desinformar. Se as pessoas querem começar a investir mas têm pouco dinheiro, a minha sugestão é que invistam nelas próprias. Aumentar o salário tem de ser a prioridade número um, pois isso é que permite que depois poupem mais dinheiro ao final do mês. É também por isso que em alturas de crise as pessoas que tornam algo tão negativo em algo positivo são aquelas que se reinventam, que melhoram as suas qualificações para terem uma vantagem competitiva e que saem da crise melhor do que outras que não fizeram o mesmo. Depois de melhorarem o seu rendimento principal, aí, é altura de olhar para outros produtos de rendimento passivo.

Qual é o feedback que recebe dos vídeos que faz?

O feedback inicial foi muito bom. Fiquei muito surpreendido com o apoio. Desde partilhas a comentários de incentivo... Foi algo que me deixou muito feliz. Não é fácil as pessoas exporem-se hoje em dia nas redes sociais sem pensarem que algo pode correr mal.

Gosto de dizer que estou à procura de visibilidade e de criar uma marca pessoal, ajudando outros em dúvidas que eu tive no meu passado, mas apenas estou à procura de visibilidade positiva, não quero de todo que o YouTube defina a forma como os outros, seja pessoas ou empresas, me veem.

Olho para o YouTube como uma forma de passar e receber conhecimento, ao mesmo tempo dar a conhecer outras competências que tenho, pois acho que isso vai continuar a ser chave no futuro de trabalho e dos negócios.

Há duas mensagens conflituosas: um lado a dizer que o futuro chegou e quem não estiver no comboio vai perder a oportunidade de uma vida e outra mensagem que diz que o comboio está a alta velocidade numa linha que não está acabada, que vai descarrilar

Em Portugal repetem-se os alertas da CMVM e do Banco de Portugal sobre entidades não autorizadas a exercer atividade de intermediação financeira - ultimamente até mais relacionados com ativos virtuais. Considera que isto contribui para uma conotação negativa relativamente a este mercado?

Claro que sim. Acho que há duas mensagens conflituosas: um lado a dizer que o futuro chegou e quem não estiver no comboio vai perder a oportunidade de uma vida e outra mensagem que diz que o comboio está a alta velocidade numa linha que não está acabada, que vai descarrilar.

Acho que, acima de tudo, há muitas pessoas a deixarem-se iludir pelo sonho de enriquecer de um dia para o outro que nem se preocupam com a sua segurança, que é exatamente para isso que precisam de ser entidades reguladas. Hoje em dia é muito fácil abrir um 'negócio' na internet e de um momento para o outro fechar. Se isso acontecesse, o investidor fica totalmente indefeso.

O mercado das criptomoedas (ou ativos virtuais ou ativos digitais), por exemplo, é um mercado especulativo e sem regulação ou pouca regulação em muitos países. A grande dificuldade de regular deve-se ao facto de serem ativos descentralizados mundialmente o que dificulta a atividade dos reguladores locais.

Costumo dizer que, sendo um mercado tão especulativo, só  devemos investir em criptomoedas se não precisarmos do dinheiro investido

Como é que olha para as criptomoedas? 

Criptomoedas neste momento são um ativo especulativo arriscado, mas a forma como  olho para ele é como uma forma de diversificar o meu portefólio, em tecnologias que acho que podem trazer muitos aspetos positivos para a sociedade. Quando somos jovens ou quando temos muito capital podemos ter uma parte do nosso capital em ativos como estes altamente disruptivos, mas arriscados. Como não sabemos o que o futuro nos irá trazer, acho que faz todo o sentido estarmos expostos de alguma forma, seja a deter criptomoedas diretamente ou indiretamente através de empresas cotadas em bolsa que suportam esta economia digital. Costumo dizer que, sendo um mercado tão especulativo, só  devemos investir em criptomoedas se não precisarmos do dinheiro investido.

Acho importante sublinhar que todos podemos e devemos investir uma parte do nosso rendimento, de forma segura e informada, claro

Na sua opinião, em que é que a visão que os portugueses têm do mercado difere da que existe no Dubai?

Aqui nos Emirados há restrições no que toca à entrada de vários players internacionais em certas áreas de negócio. Aplicações de carteiras digitais, com fácil acesso aos mercados internacionais ainda estão numa fase embrionária de expansão dentro deste mercado. É mais fácil eu investir através de empresas que prestam serviços na Europa do que é aqui. Portanto, em Portugal as opções para começar são muitas, intuitivas e com comissões baixas. Com esta competição os bancos começaram a desenvolver soluções em linha com a competição, no entanto, acho que ainda estão um bocado atrás se comprarmos com as fintechs. Claro que no Dubai há muito capital e as pessoas, por norma, têm rendimentos mais altos, pois não há impostos, no entanto, acho importante sublinhar que todos podemos e devemos investir uma parte do nosso rendimento, de forma segura e informada, claro. 

O grande objetivo é nós chegarmos a um momento da nossa vida em que o dinheiro trabalha por nós em vez de nós trabalharmos pelo dinheiro

Para terminar, num dos seus vídeos fala sobre o seu foco em liberdade financeira. O que é isso da liberdade financeira?

Liberdade Financeira é um termo bastante utilizado nos dias de hoje. O grande objetivo é nós chegarmos a um momento da nossa vida em que o dinheiro trabalha por nós em vez de nós trabalharmos pelo dinheiro. É ter investimentos ou poupanças que nos permitem pagar todas as nossas despesas mensais sem termos de trabalhar, ou seja, uma reforma antecipada.

Quando ouvi isto pela primeira vez, pareceu-me bastante estranho... Adoro o que faço, por que motivo iria querer parar de trabalhar ou me reformar? Então a minha ideia é apenas chegar a um ponto da minha vida em que o trabalho não comanda as minhas decisões, em que posso dedicar o meu tempo a fazer aquilo que gosto, sem ter o medo de estar a ficar para trás no mercado de trabalho ou até mesmo sentir que as minhas obrigações financeiras me obrigam a trabalhar em algo que não quero. Perco eu e a empresa onde estou. Não consigo imaginar a quantidade de pessoas que vai todos os dias para o trabalho e só pensa no salário do final do mês.

Felizmente, isso nunca me aconteceu, até porque sou uma pessoa que está constantemente a aprender novas coisas, então este ciclo de melhoria contínua é o que me move.

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