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Diretiva: Setor do cinema e audiovisual reafirma divisões

Três audições parlamentares sobre o projeto de proposta de lei que transpõe a diretiva europeia de serviços audiovisuais voltaram a mostrar a divergência no setor entre quem a encara como uma oportunidade perdida e quem vê um momento histórico.

Diretiva: Setor do cinema e audiovisual reafirma divisões
Notícias ao Minuto

14:32 - 14/10/20 por Lusa

Economia Cinema

Por um lado, os subscritores da carta aberta "Ganhar uma oportunidade histórica para o cinema e audiovisual português", entre os quais estavam, para além de outros, a produtora Pandora da Cunha Telles e o realizador António-Pedro Vasconcelos, defenderam que se poderá assistir ao nascimento de um novo setor audiovisual português, com a aprovação do projeto de lei.

Numa audição na qual se ouviram variadas críticas aos concursos do Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA), Susana Gato, da Associação de Produtores Independentes de Televisão, afirmou, admitindo que até se emocionou ao ler o documento: "A diretiva visa essencialmente promover as obras europeias garantindo a diversidade cultural dos vários países da Europa. Ou seja, tentar cortar com a prioridade das obras americanas. É por isso que estamos aqui."

Quer o dirigente da Associação de Realizadores de Cinema e Audiovisual (ARCA), António-Pedro Vasconcelos, quer o realizador João Maia, da Associação Portuguesa de Realizadores e Argumentistas de Ficção (APRAF), e Tiago Santos, da Associação Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos (APAD), lamentaram a "dependência" do setor do ICA, tendo Maia declarado que "a Netflix e outras plataformas dão a hipótese de estar num mercado global e isso é uma oportunidade que [ninguém] gostaria de perder".

Pandora da Cunha Telles, na mesma audição, realçou que a discussão sobre os problemas do ICA de há 25 anos tem a sua "sede própria", algo que foi sublinhado mais tarde pela deputada do Bloco de Esquerda Beatriz Gomes Dias.

Cunha Telles frisou que o objetivo da discussão será "descentralizar o poder de decisão, permitir que haja outros lugares onde essa decisão [sobre financiamento] possa ser tomada e não apenas dentro de uma linha de apoio com um conjunto de jurados", como no ICA.

Por seu lado, os representantes da Plataforma do Cinema classificaram como uma ilusão a ideia de que vai ser esta alteração legislativa que vai fazer com que as obras portuguesas cheguem a "patamares internacionais" e lembraram que as plataformas de 'streaming' já estão presentes no mercado e a negociar com intervenientes portugueses.

"Perdeu-se uma oportunidade de melhor ponderar isto", afirmou o produtor Luís Urbano, que reconheceu que o projeto de proposta de lei deverá ser aprovado, na sexta-feira à tarde, mantendo a plataforma a sua "batalha".

"Foi uma batalha que foi muito intensa, mas foi muito provocada com o episódio de sexta-feira no ICA, em que fomos convocados para discutir o plano plurianual para o período de 2021-2025, e sem qualquer tipo de documento de suporte. [...] Ficámos absolutamente perplexos quando a reunião era para nos apresentar uma consultora estrangeira que iria elaborar o plano e talvez tenha sido esse o gatilho que nos ofendeu e levou a dizer assim 'espera lá, vão aprovar uma lei à pressa e vamos ficar com este secretário de Estado a fazer a regulamentação'", disse o produtor.

Logo de seguida, Urbano sublinhou: "Para nós foi uma ofensa e depois, lamento dizer, estará ele bom da cabeça a pensar que íamos assistir a isto de bom grado?".

Grande parte da discussão ao longo da manhã centrou-se no financiamento do ICA, com a Plataforma do Cinema a alertar, como já antes o havia feito, que a aprovação desta legislação poderá significar uma redução do orçamento do instituto, enquanto do lado dos subscritores da carta "Ganhar uma oportunidade histórica para o cinema e audiovisual português", Pandora da Cunha Telles defendeu que a transposição da diretiva abre a porta ao aplicar da taxa de exibição noutros "locais para onde a publicidade está a migrar" e um consequente aumento de receitas do ICA.

O realizador João Salaviza, da Plataforma do Cinema, alertou para as eventuais dificuldades no momento da regulamentação poderão gerar atrasos nos próprios concursos do ICA, caso a proposta de lei seja aprovada nos atuais termos.

Contactado pela agência Lusa, o presidente do ICA, Luís Chaby Vaz, afirmou que os concursos de 2021 abrirão nos prazos normais, no começo do ano.

Ambos os lados remeteram para o parecer do ICA sobre a proposta de lei, embora com propósitos diferentes.

Nesse texto, o ICA estima que "o impacto financeiro desta medida na receita do ICA seja muito pouco expressivo", mas avisa: "Quanto à inclusão da publicidade audiovisual inserida em serviços de partilha de vídeos, espera-se um impacto positivo na receita do ICA, não superior a cerca de 5%. No entanto, este crescimento pode não compensar variações negativas da publicidade nos meios 'tradicionais', cenário, infelizmente, expectável no momento da redação do presente parecer".

"O aumento cumulado esperado máximo (Orçamento do Estado + receitas da publicidade audiovisual em plataformas de partilha de vídeos) corresponderia a 15% - 20% da receita atual. Logo, não acomoda mais do que uma perda equivalente a nível de outras receitas (taxa de exibição sobre publicidade em meios 'tradicionais' e taxa de subscrição)", pode ler-se mais à frente no documento, um de dezenas apresentados por diversas entidades, empresariais e associativas, no contexto da discussão pública sobre a transposição.

Também ouvido hoje foi Frederico Serra, da Associação de Produtores de Cinema e Audiovisual, que salientou que deveria haver mais tempo para discutir o assunto, acreditando que os deputados iriam ter "pouca informação" para tomar uma decisão.

A estas três audições vai juntar-se, hoje à tarde, a de representantes do movimento "Pelo Cinema Português", que no fim de semana lançou também uma carta aberta intitulada "Governo português anuncia a morte do cinema português".

As quatro audições acontecem um dia depois de os deputados terem adiado a votação parlamentar da proposta de lei 44/XIV, que transpõe uma diretiva europeia sobre audiovisual.

À semelhança da maioria dos países europeus, Portugal já ultrapassou o prazo para transpor para a legislação nacional uma diretiva, de 2018, que tem como objetivo regulamentar, entre os Estados-membros, a atividade dos serviços de televisão e dos serviços audiovisuais a pedido, conhecidos como VOD ('video on demand'), como as plataformas Netflix, HBO e Amazon.

Na diretiva europeia lê-se que "o mercado dos serviços de comunicação social audiovisual tem evoluído de forma rápida e significativa devido à convergência atual entre a televisão e os serviços de Internet", pelo que é preciso que a legislação acompanhe essa evolução.

É pedido, por isso, legislação que promova "um equilíbrio entre o acesso aos serviços de conteúdos em linha, a proteção dos consumidores e a competitividade".

A Comissão Europeia publicou as orientações de aplicação em julho, que apontam para uma quota de 30% de obras europeias nos serviços por subscrição (VOD), com definição de mecanismos para medição dessa quota, assim como de isenções de taxas a pequenos operadores, em função do baixo volume de negócios ou da audiência.

O Governo terá ainda de criar mais mecanismos de proteção dos consumidores, em particular dos menores de idade, reforçar o acesso das pessoas com deficiência e necessidades especiais aos serviços de televisão e prevenir o discurso do ódio e do incitamento à violência e ao terrorismo.

A proposta de lei 44/XIV, que implicará alterações nas leis do Cinema e da Televisão, define a cobrança da taxa de exibição para todo o tipo de serviços em que exista transmissão de publicidade e obrigações de investimento para, entre outros, operadores de serviço de televisão e as plataformas de 'streaming'.

Estes operadores e plataformas exercem "com total liberdade de escolha" os projetos em que têm de investir e os montantes são definidos em função dos "proveitos". Ficam de fora desta obrigação todos os que "tiverem baixo volume de negócios ou baixas audiências".

A proposta de lei define ainda que os custos de funcionamento do ICA passam a ser considerados despesas do Orçamento do Estado, o que permitirá libertar verbas das receitas próprias deste organismo para investimento no setor.

Segundo a Comissão Europeia, até ao momento, quatro Estados-membros já notificaram Bruxelas da transposição total ou parcial da diretiva, estando "a maioria dos demais" a desenvolver o processo legislativo, com vista a que esteja completo ainda este ano ou no começo de 2021.

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