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Carlos Costa cumpre 10 anos na liderança do Banco de Portugal

Os 10 anos de Carlos Costa como governador do BdP, que se assinalam hoje quando está a terminar o mandato, foram intensos e polémicos, com a 'troika', a queda do BES, num setor que julgou sólido, e severas críticas.

Carlos Costa cumpre 10 anos na liderança do Banco de Portugal
Notícias ao Minuto

10:49 - 07/06/20 por Lusa

Economia Banco de Portugal

Nascido em 1949 em Oliveira de Azeméis, Carlos Costa chegou a governador do Banco de Portugal (BdP) no verão de 2010, nomeado pelo governo socialista de José Sócrates para suceder ao ex-secretário geral do PS Vítor Constâncio (que foi ocupar a vice presidência do Banco Central Europeu). Seria reconduzido no cargo em 2015, pelo executivo PSD/CDS-PP liderado por Passos Coelho.

Licenciado em economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto, Carlos Costa tinha um percurso na banca onde teve altos cargos nos grupos Caixa Geral de Depósitos (CGD) e BCP, nas instituições europeias (foi coordenador dos Assuntos Económicos e Financeiros na Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia e chefe de gabinete do comissário europeu João de Deus Pinheiro) e era então vice-presidente do Banco Europeu de Investimento.

Desconhecido para o grande público, a sua escolha foi elogiada. Os primeiros anos foram relativamente pacíficos, apesar da intervenção da 'troika', de quem foi interlocutor e com quem teve que negociar matérias complexas e interesses divergentes, e da gestão do setor financeiro.

Já o ano de 2014 ficou marcado pela queda do BES e do grupo Espírito Santo, com as consequências que lhe seguiram a tornar o seu percurso como governador conturbado. Sucederam-se manifestações de lesados, incluindo à porta da sua casa em Lisboa, e centenas de processos contra o Banco de Portugal, mas também alguns contra si. Situações que amigos avaliam como um golpe que lhe abalou a autoconfiança.

Não evitou severas críticas políticas, sobre o caso BES mas também sobre o Banif, tendo mesmo sido falada a sua exoneração, o que não aconteceu.

Permaneceu ancorado na proteção do Banco Central Europeu (BCE) e das leis que regem o seu cargo, do qual é inamovível e só pode ser exonerado se não cumprir os requisitos da função (idoneidade, capacidade e experiência de gestão, domínio de conhecimento nas áreas bancária e monetária) ou tiver cometido falta grave.

Pelo meio, lidou com os efeitos da nacionalização do BPN, falou em tribunal no julgamento de gestores do BCP sobre as sociedades 'offshore' criadas nos anos em que foi diretor da área internacional (disse que não tinha conhecimento da sua gestão nem que não tinham beneficiário último) e opôs-se às partes da reforma do setor financeiro proposta pelo Governo (que nunca foi avante) que considerava que punham em causa a independência do banco central.

Foi há precisamente dez anos, em 07 de junho de 2010, que Carlos Costa tomou posse como governador do BdP.

No seu discurso, alertou para o endividamento de Portugal, face às dificuldades que o país já sentia para se financiar no contexto de crise internacional e, sobre o sistema bancário, defendeu um reforço da supervisão, mas considerou: "o sistema financeiro português está sólido".

"O sistema financeiro português está sólido. Não esteve diretamente exposto à designada crise do 'sub prime' e, por iniciativa do BdP, reforçou a sua base de fundos próprios para níveis que o colocam bem no plano internacional", afirmou então, no salão nobre do Ministério das Finanças.

Ao longo do restante ano 2010 e inícios de 2011, com o agravamento da conjuntura do país, dos juros da dívida pública e das dificuldades de financiamento dos bancos, o discurso sobre o setor tornou-se mais cauteloso e as movimentações frequentes num setor financeiro muito preocupado.

Em fevereiro de 2011, na primeira entrevista como governador, à Económico TV, Carlos Costa afirma que Portugal já está em recessão, contrariando o discurso oficial do Governo.

Em maio de 2011, o então primeiro-ministro, José Sócrates, anuncia o resgate da 'troika' (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu).

Nos anos seguintes, já com o governo PSD/CDS-PP de Passos Coelho (que subiu ao poder em junho de 2011), Carlos Costa foi um dos principais interlocutores com a 'troika' sobre o setor financeiro (segundo o próprio, foi graças à sua intervenção que a CGD não foi parcialmente privatizada) mas também sobre o programa de ajustamento da economia.

O BdP inspecionou o balanço dos bancos, que tiveram de reforçar indicadores de solidez, alterar modelos de negócio e de gestão de ativos. Em junho de 2012, CGD, BCP, BPI recorreram mesmo à ajuda do Estado para se recapitalizarem.

O sistema financeiro continuaria a fazer o 'caminho das pedras' e, em maio de 2014, Passos Coelho anuncia a 'saída limpa', o fim do programa de resgate sem recorrer a programa cautelar.

Então, já havia notícias sobre a grave situação do BES (que em 2012 tinha recusado a ajuda estatal) e do grupo Espírito Santo e movimentações nas altas esferas sobre o que poderia ser feito.

No BdP, sabe-se hoje, o governador tinha tido enfrentamentos privados com o banqueiro Ricardo Salgado e tinha havido debate entre altos quadros sobre a retirada da idoneidade a Salgado, havendo o consenso de que a lei não conferia ao supervisor o poder necessário.

As declarações públicas eram de que o BES estava sólido, capitalizado e que os riscos tinham que ver com a área não financeira, mas que se fosse necessário havia acionistas interessados num aumento de capital.

Em 30 de julho -- com o BES presidido pelo economista Vítor Bento, que substituiu Salgado (afastado por pressão do BdP) -- já se esperava um rombo forte, mas a realidade sobre as contas do primeiro semestre superou as expectativas.

Foram revelados 3,6 mil milhões de euros de prejuízos, postas a descoberto uma série de irregularidades financeiras e rácios de solvabilidade abaixo do mínimo para funcionar. Mas mantinha-se a garantia do governador de que o banco ia continuar, sendo necessário um aumento de capital.

Contudo, em cinco dias de intensos contactos entre BdP, Governo, Comissão Europeia e BCE tudo mudaria. Seria posto fim à instituição centenária fundada pela família Espírito Santo.

Perto das 23:00 da noite de domingo 03 de agosto, numa declaração ao país, Carlos Costa anunciou o fim do BES tal como era conhecido, passando a 'banco mau' (que ficou com ativos e passivos tóxicos, assim como os acionistas), e a criação do Novo Banco capitalizado pelo Fundo de Resolução.

O caso BES haveria de perseguir Carlos Costa nos anos seguintes, até hoje, e provavelmente de futuro.

Foi acusado de supervisão ineficaz, de não ter afastado Ricardo Salgado atempadamente, de ter feito pequenos acionistas acreditar no banco apesar de já saber dos problemas. Surgem então as manifestações de lesados do BES/GES, os processos em tribunal e as muitas críticas de diversos quadrantes parlamentares.

Em julho de 2015, o governo de Passos Coelho reconduziu Carlos Costa para um segundo mandato de cinco anos, tendo o então secretário-geral do PS, António Costa, considerado ser "um gravíssimo erro do senhor governador achar que basta ter a confiança da ministra das Finanças e do primeiro-ministro para merecer a confiança dos portugueses".

O segundo mandato de Carlos Costa seria já maioritariamente com o Governo PS de António Costa, que tomou posse em novembro de 2015, com quem negociou o resgate do Banif (2015) e a venda do Novo Banco (2017). Contudo, a relação seria conturbada, sobretudo com o ministro das Finanças, Mário Centeno.

Centeno que, enquanto vice-diretor do departamento de estudos económicos do BdP se candidatou em 2013 ao cargo de diretor, acabando o concurso sem um eleito. Segundo fontes da TSF, que divulgou a notícia, o 'chumbo' de Centeno estaria relacionado com as suas intervenções públicas e críticas ao Governo violando o dever de reserva.

O 'azedo' da relação entre Centeno e Carlos Costa nunca passou, segundo várias fontes do setor financeiro.

Seria a propósito do resgate do Banif, que aconteceu em dezembro de 2015, pouco tempo após o governo PS tomar posse, que estalaria o 'conflito' entre o executivo e o governador.

Em abril de 2016, o Governo acusou (primeiro pelo secretário de Estado Adjunto e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, e depois pelo próprio ministro das Finanças) o BdP de ter cometido uma "falha de informação grave" ao ter omitido que pediu ao BCE para limitar o financiamento ao Banif. Carlos Costa respondeu dizendo que não informou o Governo porque "não podia", devido às normas europeias que regem os bancos centrais.

Apesar da polémica criada -- e de o BE ter questionado quantas falhas graves é preciso o governador cometer para ser destituído (referindo-se a BES e Banif) --, o primeiro-ministro pôs água na fervura, referindo que devia haver normalidade no relacionamento institucional.

Já no início de 2019, o tom crítico sobre o governador e mesmo a eventual exoneração voltou à agenda partidária, desta vez por uma polémica relativa à sua intervenção na concessão de créditos problemáticos pela CGD quando era administrador do banco público (entre 2004 e 2006), tendo então argumentado que não participou nas reuniões que decidiram os empréstimos.

Teve ainda de explicar umas férias que passou no empreendimento Vale do Lobo, referindo que as pagou e que não esteve na reunião que deu a aprovação final a esse empréstimo, e sobre o monte Alentejano que comprou a Armando Vara (ex-ministro condenado por tráfico de influência e seu colega na administração da CGD), disse que o fez porque os "serviços da Caixa identificaram a oportunidade".

As opiniões negativas sobre Carlos Costa fizeram-se ouvir da esquerda à direita e o BE pediu formalmente no parlamento a sua exoneração, tendo o projeto de resolução sido chumbado em 27 de fevereiro, com os votos contra do PS e do PSD. BE, PCP, PEV e PAN votaram a favor e o CDS-PP absteve-se.

O presidente do PS, Carlos César, disse em entrevista à TSF que "pedir uma exoneração de A e B à menor das circunstâncias é ceder à política do espetáculo", ainda que considerando que desempenho de Carlos como governador foi "marcado pela passividade". E acrescentou: "todos, provavelmente até o próprio, anseiam por esse momento" do fim de mandato.

O ano de 2019 ficaria ainda marcado por críticas do BdP à reforma da supervisão financeira proposta pelas Finanças, que Carlos Costa considerava que reduzia a independência do banco central, nomeadamente por o querer sujeitar à fiscalização da Inspeção-Geral de Finanças (em áreas não relativas à política monetária) e por querer alterar as causas da exoneração do governador. A reforma nunca foi avante.

Já nos últimos meses os holofotes estiveram menos intensos sobre a atuação de Carlos Costa, ainda que a supervisão do BdP tenha sido novamente questionada na sequência caso 'Luanda Leaks' e de acusações de uso dos bancos portugueses para branqueamento de capitais de Angola.

Em maio último, numa entrevista ao Expresso de fecho de mandato (termina em 09 de julho), o governador defendeu a independência do BdP, afirmando que é hoje uma "máquina rejuvenescida, com muito maiores competências, com uma estruturação muito forte, com um sentido de missão e um foco muito claro.

Questionado sobre o nome que mais tem sido mencionado para lhe suceder, afirmou que Mário Centeno "tem todas as condições para ser um grande governador do BdP".

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