"Itália é exemplo de crise silenciosa sem corrida aos depósitos"
O economista Andrei Shleifer afirmou, em entrevista à Lusa, que a banca italiana é uma das "questões-chave" na Europa, sendo "exemplo de uma crise silenciosa sem corrida aos depósitos", que poderá 'explodir' a qualquer momento.
© Reuters
Economia Andrei Shleifer
"Uma das questões-chave que é interessante para a Europa neste momento, e isto tem-se vindo a arrastar há anos, é a Itália", disse o académico mais citado do mundo de acordo com o índice RePEc, à margem do 46.º encontro anual da Associação Europeia de Finanças, que decorreu entre 21 e 24 de agosto na Nova School of Business and Economics (SBE), em Cascais, distrito de Lisboa.
"O sistema bancário italiano está obviamente completamente estragado, ninguém duvida disto, o que teve um enorme efeito adverso no crescimento [económico]. É um exemplo de uma crise silenciosa sem corrida aos depósitos, mas a Itália está no meio de uma completa crise bancária, em movimento lento", considerou.
Questionado pela agência Lusa sobre se uma crise bancária poderia 'explodir' a qualquer momento, como aconteceu com o banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos, em 2008, Shleifer respondeu que "se pode perfeitamente imaginar isso a acontecer em Itália".
"Na Grécia, se se lembrar bem, sofreu-se a crise e ela foi extremamente lenta. Perguntavam 'por que motivo irão as pessoas retirar dinheiro dos bancos gregos?'. Demorou dois anos, mas um dia aconteceu. E em Itália isto está a acontecer há pelo menos 10 anos, por isso não se sabe [quando poderá acontecer]", lembrou o académico que leciona na Universidade de Harvard.
"Os bancos italianos não estão a fazer dinheiro. O ponto que eu gostaria de salientar é que isto [uma crise] não acontece do nada. Se há uma reversão no preço das casas, se os bancos começam a perder dinheiro, haverá um ano ou dois antes de vermos uma crise plena", reforçou.
Andrei Shleifer afirmou ainda que se "se acreditar nos números", a economia americana está menos vulnerável do que a europeia.
"Se acreditar nos números, a economia americana está muito melhor que a europeia, e o sistema bancário americano está muito melhor capitalizado que o sistema bancário europeu, portanto mesmo no caso de um choque adverso, o setor bancário [americano] aguentaria", considerou.
Contudo, o economista referiu que se "se pensar que os testes de 'stress' foram manipulados, ou que a contabilidade dos bancos dos Estados Unidos foi manipulada, fica-se mais nervoso".
Questionado se há razões para equacionar tal cenário, Andrei Shleifer respondeu que "há muita arte no que diz respeito à contabilidade dos bancos" e que o cenário "é provavelmente pior na Europa do que nos Estados Unidos".
"Perguntou-me se os reguladores europeus estão prontos para reestruturar os bancos italianos. Não me parece ser o caso", disse Andrei Shleifer à Lusa.
O economista classificou o sistema bancário europeu de "engraçado", uma vez que "por um lado temos um regulador europeu" e por outro "deixa-se espaço para resgates nacionais".
Segundo Shleifer, a questão essencial é saber "até que ponto irão as autoridades nacionais estar dispostas a resgatar as suas instituições financeiras".
"A resposta é que irão. Na Alemanha certamente, e em França sempre. Não há instituição em França que o Governo não ache que não valha a pena resgatar", sublinhou.
Andrei Shleifer elogiou ainda o presidente cessante do Banco Central Europeu, Mario Draghi.
"Acho que foi um excelente banqueiro central. Eu percebo que toda a gente goste dele", disse, acrescentando que "ele estará quase de certeza certo em que o banco central se deva tornar mais proativo".
Para o futuro da economia europeia, Andrei Shleifer crê que "muito irá depender da Alemanha e de Itália".
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