A temporada 2024/25 estará na memória de Jonathan Buatu, que teve de enfrentar três mudanças de treinador para poder alcançar a tão desejada permanência com no principal escalão do futebol nacional, ao serviço do Gil Vicente.
Em entrevista exclusiva ao Desporto ao Minuto, o defesa-central assume a responsabilidade pelos resultados aquém das expetativas. Ainda assim, sublinha que a equipa tinha enorme qualidade, com rasgados elogios a Félix Correia, um dos nomes a ter em conta no mercado de transferências do verão.
O internacional angolano, de 31 anos, já passou por Bélgica, Inglaterra, Turquia e França. Em Portugal, o Gil Vicente é o terceiro clube no qual atua, depois do Rio Ave e do extinto Desportivo das Aves. Aborda, ainda, o papel do técnico Pedro Soares Gonçalves na evolução do futebol angolano, que poderia contar com o contributo de Florentino Luís, do Benfica.
A temporada de 2024/25 terminou. Qual é o balanço?
Foi uma época dura, bastante longa e com o sentimento de dever cumprido. Conseguimos a permanência numa época que podia ser mais tranquila, mas o principal objetivo do Gil Vicente foi alcançado.
Sente que o Gil Vicente poderia ter ido além do 13.º lugar na classificação?
Claro que sim. A equipa tinha qualidade, mas faltou consistência. Tivemos altos e baixos, mas não precisávamos de passar por alguma aflição, nas últimas jornadas do campeonato.
Foram três treinadores [Tozé Marreco, Bruno Pinheiro e César Peixoto] ao longo da temporada. Como foi lidar com isso?
Não foi fácil, cada um tem as suas ideias, as suas características, a sua maneira de treinar. Tivemos de nos adaptar, trocar o 'chip' várias vezes e, por isso, foi uma época exigente. Tentámos, com cada um, fazer o melhor para render no campo.
[César Peixoto] trouxe uma nova energia, chegou num momento em que estávamos algo presos, sem confiançaQual foi a saída mais impactante?
A saída do Tozé Marreco, antes do início da Liga. Apanhou o grupo de surpresa. Tinha uma boa relação com ele, assim como com o Bruno Pinheiro, mas reconheço que era mais especial com o Tozé Marreco.
Como viu a despromoção do técnico Tozé Marreco, com o Farense?
Fiquei triste. Quando ele chegou, na época passada, deu-me a oportunidade jogar, numa altura em que a minha confiança não era a melhor para ajudar o clube, e isso não esqueço. Confesso que queria que o Farense se mantivesse, por causa do Tozé Marreco.
Do seu ponto de vista, as mudanças de treinador foram prejudicais ou ajudaram o Gil Vicente, em 2024/25?
Quando a equipa não apresenta os resultados esperados, o treinador é quem paga. Infelizmente, é assim. É mais fácil trocar de treinador do que mandar 24/25 jogadores embora. É ingrato, pois não é só o treinador. Nós, jogadores, também temos a nossa parte na responsabilidade. Por vezes, a mudança faz bem para haver aquele choque, outras vezes, não. Depende muito das circunstâncias.
Não fomos a Alvalade para passear, queríamos e precisávamos de pontuar. Conseguimos parar, em grande parte, a linha da frente do Sporting, que não é só o Gyokeres. Há também o Trincão, o Pedro Gonçalves, o Debast, entre outrosDe que forma a chegada do técnico César Peixoto melhorou o Gil Vicente?
Trouxe uma nova energia, chegou num momento em que estávamos algo presos, sem confiança. Depois, crescemos e pontuámos quando era preciso, nomeadamente, nos confrontos diretos com as equipas na mesma situação do que nós.
Na reta final do campeonato, há um jogo marcante frente ao Sporting, em Alvalade. A derrota (1-2) não impediu os rasgados elogios à exibição da equipa, sobretudo, na primeira parte...
Quando vais jogar com uma equipa com a qualidade do Sporting, tu sabes que tens de ter uma tática muito bem definida, e nós apresentámos um plano de jogo defensivo muito bom para aquele jogo. Nós tivemos uma atitude competitiva muito boa e as pessoas esquecem que nós não tínhamos a nossa situação resolvida. Não fomos a Alvalade para passear, queríamos e precisávamos de pontuar. Conseguimos parar, em grande parte, a linha da frente do Sporting, que não é só o Gyokeres. Há também o Trincão, o Pedro Gonçalves, o Debast, entre outros. Acabámos por perder o jogo no último lance [golo de Eduardo Quaresma].
Quem são jogadores que destaca no Gil Vicente, nesta temporada?
O Fujimoto é muito forte na visão de jogo, no jogo entrelinhas. O Tidjany Touré tem um 1x1 como nunca vi, é espetacular. Falta-lhe consistência. O Félix Correia é, taticamente muito forte, é dos melhores com que já joguei nesse aspeto, apesar da sua idade [24 anos]. É forte tecnicamente e está preparado para dar o salto, tem a maturidade para entrar em qualquer plantel dos 'grandes'.
[Félix Correia marcou 10 golos e deu passes para golo em 2024/25]© Getty Images
[Félix Correia] é bom com bola, inteligente, sabe definir os momentos do passe, tem bom remate. Seria um bom jogador para o BenficaQual seria a melhor opção?
O Benfica.
Porquê?
Acho que é um tipo de jogadores que o clube gosta, é bom com bola, inteligente, sabe definir os momentos do passe, tem bom remate. Seria um bom jogador para o Benfica.
Na próxima época, já sabe que não irá ter o Ruben Fernandes como companheiro...
É um grande capitão e uma excelente pessoa dentro e fora de campo. Não há palavras para dizer o que o Rúben representa para o Gil Vicente. Foi um privilégio jogar ao seu lado neste ano e meio. Foi pouco tempo, mas um prazer.
Apanhou-o de surpresa esta tomada de decisão da direção em deixá-lo sair?
Sim, porque ele estava já há muitos anos [seis] no clube. Sinceramente, pensei que o Rúben ia acabar a carreira no Gil Vicente, mas o futebol é o que é...
[Rúben Fernandes representou o Gil Vicente durante 6 temporadas]© Getty Images
Sendo um dos jogadores mais experientes do plantel, ambiciona ficar com a braçadeira de capitão, na próxima época?
Não estou focado nisso. Isso é um 'problema' do mister, eu estou apenas lá para ajudar a equipa com ou sem a braçadeira. Se o mister escolher-me como capitão, vou aceitar, mas não estou na corrida, até porque há outros jogadores com mais anos de clube e com bastantes jogos na I Liga.
Já passou por campeonatos como o inglês, belga, turco e francês. Como avalia o português?
Na Bélgica e na França, o futebol é mais físico. Em Inglaterra, a intensidade do jogo é espetacular. A I Liga é mais 'tranquila', maior aposta no nível tático e técnico.
É em Portugal que vê os seus próximos anos de carreira?
O futuro nunca se sabe, mas tenho contrato por mais um ano com o Gil Vicente. Não tenho um plano definido.
Olhando para a sua carreira internacional, a seleção de Angola está em franco crescimento com o técnico Pedro Soares Gonçalves...
O mister já trabalha na equipa há sete anos. Temos conseguido acrescentar qualidade à equipa, com a chegada de jovens jogadores, que precisamos. Crescemos muito, e os quartos de final do CAN'2023 [Campeonato Africano das Nações] é prova disso. Perdemos [0-1] com a Nigéria.
[Jonathan Buatu em duelo com Victor Osimhen]© Getty Images
O quão difícil é disputar o CAN?
É um torneio de detalhes, tens de ser mais 'esperto' a gerir o jogo e saber lidar com as emoções. Equipas como a Nigéria e Costa do Marfim contam com jogadores muito experientes, que jogam em grandes equipas europeias. A qualidade é importante, mas a experiência também é vital.
Representar a seleção angolana é o maior feito da carreira?
Obviamente. Temos essa pressão de representar o povo, que assumo com prazer. Atualmente, estamos na corrida para o Mundial e o desafio é não baixar do patamar em que estamos.
[Florentino Luís] tem qualidade e ia ajudar o crescimento da nossa equipa, mas não é algo que me compete falar
Contar com um jogador como o Florentino Luís, do Benfica, seria importante para si?
Tem qualidade e ia ajudar o crescimento da nossa equipa, mas não é algo que me compete falar.
Entristece-o que ele esteja ainda à espera de uma hipotética convocatória da seleção portuguesa?
Não sou eu que vou falar, não é o meu trabalho. Como jogador, seria uma mais-valia. Agora, se ele deve escolher entre Angola e Portugal, é com ele.
[Jonathan Buatu soma um golo em 50 internacionalizações]© Getty Images
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