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Futebol volta ao sinal aberto. O bom, o mau e o problema... milionário

Decisão do Governo em transmitir jogos e provas de relevo em sinal aberto está a dar que falar. Em conversa com o Desporto ao Minuto, Pedro Brinca, professor universitário, alertou para os impactos na indústria do futebol e abordou ainda o 'primeiro passo' dado pelo Moreirense.

Notícia

© Getty Images

Miguel Simões
22/11/2024 07:02 ‧ há 2 semanas por Miguel Simões

Desporto

Exclusivo

É o assunto do momento no panorama desportivo português... e televisivo. Um dos mais recentes despachos do Governo português dá conta da intenção de garantir a transmissão, em sinal aberto, dos "acontecimentos que devem ser qualificados de interesse generalizado do público", já a partir de janeiro de 2025, com destaque para a presença de equipas portuguesas em eventos em provas como Liga dos Campeões, Liga Europa, Liga Conferência, Liga das Nações e Mundial de Clubes.

 

Em conversa com o Desporto ao Minuto, Pedro Brinca, professor universitário da Nova School of Business and Economics, alertou para os impactos que tal medida pode ter, a longo prazo, na indústria do futebol, embora reconheça que, para a generalidade do público, seja melhor ter a transmissão dos jogos de futebol "de graça". Além disso, a parceria anunciada entre Moreirense e TVI, igualmente na passada quarta-feira, também foi comentada pelo investigador, que admitiu a possibilidade de mais clubes seguirem o exemplo do emblema de Moreira de Cónegos.

"Tudo isto é mau para os detentores dos direitos de transmissão destes jogos. Naturalmente, veem limitada a concorrência pelo produto que querem vender apenas aos canais abertos, se bem que os canais fechados podem sempre transmitir e abrir em tempo e hora limite, mas não me parece que seja uma estratégia viável. Se o Governo passa um decreto-lei em que só se pode vender os direitos de jogos específicos a três canais, é natural que limite em certa medida. A Sport TV até podia passar em canal aberto, pela Sport TV+", começou por dizer sobre o tema.

"Para os adeptos, o melhor seria ter tudo de graça. Percebo isso, até certo ponto. Há a UEFA pelo meio, com regras de distribuição de receitas dos direitos televisivos pelos clubes. É óbvio que, quanto menor for a realização da capacidade de receitas dos direitos televisivos dos clubes, em última análise, menos receitas os clubes terão para, depois, comprar jogadores. Serão menos competitivos e a qualidade das equipas poderá ser menor. Nestes jogos em particular das competições europeias, o impacto poderá não ser tão grande, porque está do lado da UEFA. Mas é a UEFA que distribui as receitas aos clubes com base nos direitos televisivos", alertou ainda Pedro Brinca.

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Despacho foi publicado esta quarta-feira, em Diário da República.

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Para além dos jogos de futebol das várias competições internacionais de renome, também as finais da Taça de Portugal e Taça da Liga se encontram na referida lista (algo que já se verifica, atualmente), que conta ainda com eventos de outras modalidades, tais como Volta a Portugal, MotoGP e Rali de Portugal.  Tudo isto levou Pedro Brinca a 'sugerir' um outro tipo de procedimento ao Governo, com base na RTP, o "canal público de televisão".

"A minha opinião sobre isto é relativamente simples. Se o Governo quer dar espetáculo às pessoas - e não estou a emitir qualquer juízo normativo se o deve fazer ou não -, deve comprar os direitos e, depois, vendê-los a uma empresa televisiva em canal aberto. Aliás, no caso do Estado português, há um canal público de televisão. Podiam perfeitamente fazê-lo atrás da RTP. Vão ao mercado, compram os direitos e asseguram que passam em canal aberto", atirou o investigador professor universitário.

"Passar um decreto-lei em que obriga algo a estar em canal aberto, naturalmente, diminui a capacidade de geração de receitas da indústria. Não me parece que, para a indústria, seja bom, e, a longo prazo, se todos os governos fizessem isso, para o mundo do futebol, e até para os adeptos, não seria bom. No entanto, percebo que, do ponto de vista daquilo que é a política social, o futebol é importante para muitas pessoas. Muitas ficariam excluídas do consumo. Não sei se obrigar uma distribuição de graça é a melhor estratégia", acrescentou de seguida.

Contornos do anúncio do Moreirense com a TVI

Tudo aconteceu num dia em que o Moreirense alcançou um acordo com uma estação televisiva que não a Sport TV - no caso, a TVI - para a transmissão de todos os jogos dos cónegos em casa, na I Liga, entre agosto de 2025 e junho de 2028, numa medida algo pioneira, que, na perspetiva de Pedro Brinca, se pode 'esticar' a outros clubes lusos.

"O Moreirense vende os direitos a quem der mais ou ao parceiro que esteja mais alinhado com a sua estratégia. Consigo conceber que um clube como o Moreirense até possa ter sacrificado alguma receita por saber que, em canal aberto, terá uma audiência maior, algo que pode potenciar uma aproximação a clubes maiores", começou por dizer sobre o tema.

TVI assina parceria com Moreirense e vai transmitir jogos do campeonato

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Todos os jogos realizados em casa deste clube serão transmitidos neste canal,

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"Estamos a falar de um clube inserido numa freguesia [Moreira de Cónegos] com cinco mil adeptos. Pode ser uma estratégia de crescimento de mercado. Não sabemos se, do ponto de vista financeiro, a proposta da TVI era a melhor. Não me espanta que seja, dada a estrutura do mercado que neste momento existe em Portugal. Mais clubes? Por que não?", vincou de seguida, antes de pronunciar sobre o impacto na promessa de Pedro Proença, presidente da Liga, em torno da centralização dos direitos televisivos, a partir de 2028/29

"Centralização dos direitos? Não me parece ter problema algum. O Moreirense pode negociar com quem quiser até à época desportiva 2027/28. Creio que o Moreirense terá vendido [os direitos] a quem tinha a melhor proposta. Uma parte da dimensão relevante disso é, naturalmente, a compensação financeira", frisou Pedro Brinca.

O professor universitário relembra, ainda, que os produtos com mais audiência na televisão generalista são, precisamente, os eventos desportivos, tendo lamentado a decisão da Autoridade da Concorrência, em 2016, ao aprovar um "acordo de disponibilização recíproca de diretos" entre as operadoras no mercado.

"Isso, basicamente, destruiu muito do valor dos direitos que o futebol português tinha. Uma decisão, na minha opinião, incompreensível. Antigamente, o valor dos jogos do campeonato era estratégico. A operadora, fosse MEO, NOS ou Vodafone, que tivesse os jogos de futebol, também tinha uma plataforma nacional de distribuição de conteúdos e também de outros produtos, como telemóveis e pacotes de Internet. Essa foi a estratégia que a MEO adotou ao querer em exclusivo a Benfica TV, a partir da década de 2010. Afinal, as pessoas querem ver televisão para quê? São três coisas: informação, reality-shows e futebol. Os 20 programas mais vistos no segmento ao vivo foram 20 jogos de futebol", atentou.

"Num ambiente económico competitivo em que a operadora que tiver na sua plataforma a exclusividade do futebol, automaticamente, terá a maior parte do mercado de distribuição televisiva em Portugal e, através disso, uma capacidade enorme de monetizar outro tipos de produtos. Isto tudo acabou em 2016. Neste momento, as operadoras não precisam de competir entre si para passar futebol. A TVI passa nas operadoras todas. A Sport TV é propriedade das operadoras todas. O que é surreal é todas as operadoras estarem envolvidas no capital do canal premium que passa a maioria dos jogos do campeonato", completou Pedro Brinca.

Restará, agora, perceber se mais clubes irão seguir o exemplo do Moreirense e também em que moldes o despacho do Governo vai ser concretizável, em acordo com as entidades envolvidas. Mais uma 'novela' para acompanhar nos próximos tempos.

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