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Idris: O 'tubarão do Senegal' que acredita no regresso do Boavistão

Capitão dos axadrezados dá-se a conhecer numa entrevista exclusiva e revela o seu maior sonho: ser campeão pelo emblema do Bessa.

Idris: O 'tubarão do Senegal' que acredita no regresso do Boavistão
Notícias ao Minuto

08:01 - 16/05/19 por Fábio Aguiar

Desporto Boavista

Nasceu no Senegal, cedo partiu para Espanha em busca do sonho, chegou a Portugal em 2008 para representar o Águeda, passou por Sertanense, Sp. Covilhã, Arouca e Moreirense e atualmente cumpre a quinta temporada no Boavista. O perfil de líder e espírito guerreiro que coloca em cada treino e em cada jogo determinaram-lhe o estatuto de capitão, que apenas confirmou um trajeto em ascensão, com conquistas a pulso, e que serve de exemplo a muitos jovens.

Hoje, Idris é já um nome forte no universo Boavista, mas esse papel de figura desaparece com a humildade, simpatia e sentido de humor que demonstra fora dos relvados. 

Foi assim que encontrámos o médio dos axadrezados em pleno Estádio do Bessa. Aos 34 anos, o eterno 'tubarão do Senegal', como ficou conhecido após a passagem pela Sertã, entre 2009 e 2011, faz o balanço da época, recorda o trajeto pessoal marcado pelo trabalho e sacrifício e dá uma visão consciente e refletida do momento do futebol português. 

Uma entrevista exclusiva ao Desporto ao Minuto, que dá a conhecer Idris, um dos mais experientes jogadores do histórico da Invicta, e que revela o seu maior sonho: ser campeão e voltar a colocar o clube no patamar de Boavistão.  

Notícias ao MinutoIdris recebeu o Desporto ao Minuto no Estádio do Bessa e 'abriu' o coração para recordar todo um trajeto inspirador.© Fábio Aguiar

Depois de uma época bastante complicada, qual foi a sensação de viver aquela grande festa após o encontro com o Sp. Braga, que motivou até uma invasão de campo e uma cumplicidade notável entre equipa e massa associativa?

Nós nunca perdemos o nosso foco, o norte, como se costuma dizer. Se calhar, agora é mais fácil dizê-lo, mas a verdade é que sempre acreditámos que íamos conseguir a manutenção. É óbvio que esta época foi muito desgastante, com vários altos e baixos, mas quem tem objetivos bem claros e sabe que tem qualidades mais do que suficientes para os atingir, vai sempre conseguir alcançá-los. Nunca trememos em nada e nunca tivemos dúvidas de que iríamos conseguir. Por isso, a festa foi o culminar de todo o trabalho, um sentimento fantástico.

Quais foram as razões das dificuldades que a equipa sentiu nas primeiras 10 jornadas?

Se nos recordarmos bem, até vencemos em Portimão, num terreno complicado, e as coisas até estavam a correr pelo melhor, até porque a equipa tinha qualidade e sabia o que fazia. No entanto, depois disso, surgiram alguns obstáculos e nós nem conseguíamos perceber exatamente de onde vinha o problema. O grupo esteve sempre sólido, procurava a vitória, mas faltava algo que nem nós sabíamos o que era. O que é facto é que depois de algum tempo entendemos que só estava a faltar uma coisa: bons resultados. O futebol é isso mesmo, resultados. Quando não se ganha, começam os verdadeiros problemas.

Foi isso que trouxe Lito Vidigal?

Exatamente! Pela minha experiência, acho que era mesmo as vitórias que faltavam. No futebol podemos ser esforçados, jogar bonito e tudo mais, mas quando não se ganha tudo se complica. Pelo que via no balneário, sentia que era essa a nossa grande batalha. Os resultados não apareciam, felizmente conseguimos alterar isso e a festa que aqui fizemos no último jogo é a prova disso tudo. Os boavisteiros mereceram mais do que ninguém.

Dificuldades no início do campeonato? O grupo esteve sempre sólido, procurava a vitória, mas faltava algo que nem nós sabíamos o que era."

O aspeto psicológico, principalmente em termos de confiança, foi a grande alteração nessa transição de Jorge Simão para Lito Vidigal?

Penso que sim. Logo que surgiu a primeira vitória, tudo ficou mais fácil. Sentíamo-nos bloqueados antes disso. Treinávamos bem, deixávamos tudo em campo, mas algo nos impedia de ser felizes. O futebol é um jogo para quem ganha. Portanto, a partir daí, tudo mudou para melhor.

As contratações de inverno, nomeadamente o Alberto Bueno, o Sauer e o Perdigão, também contribuíram para essa melhoria coletiva...

Sim, todos ajudaram, quer os reforços que chegaram, quer os jogadores que saíram. Todos contribuíram, pois o futebol é um jogo coletivo. Importantes não são só os 11 que jogam e os três que entram no decorrer de cada partida, mas sim todos os que compõem o plantel. Para aqueles chamados titulares estarem bem preparados para jogar, os restantes têm que treinar bem. Por vezes, esses até reúnem as mesmas condições para também poderem ir lá para dentro. Por isso, todos foram super importantes.

Um desses jogadores importantes foi o Gonçalo Cardoso, que acabou por ser a grande revelação. Como capitão e jogador experiente que é, como viu a sua entrada na equipa, com apenas 18 anos e já com aquela maturidade impressionante que demonstrou desde o primeiro momento em que foi aposta?

Sem dúvida! Penso que a palavra correta é mesmo essa: maturidade. Até nós, dentro do balneário, ficámos impressionados. É um jovem, mas adulto. Tem tudo para ser um grande jogador. Só espero que continue a traçar este seu caminho e tenho a certeza que vai chegar lá a cima.

Notícias ao MinutoSenegalês acredita que os axadrezados têm condições para voltarem a ser o Boavistão de outros tempos. © Global Imagens

Essa festa no relvado, no último jogo em casa desta temporada, fez relembrar o Boavista de outros tempos. Acha que esse objetivo de voltar a ser o Boavistão está mais perto de ser alcançado?

Acho que sim! Eu sempre disse o mesmo desde o momento em que cheguei a esta casa - as entrevistas estão gravadas e todos sabem que é verdade: o maior foco do Boavista, da equipa, dos adeptos e de todas as pessoas que estão à volta do clube é voltar ao tempo em que éramos o Boavistão. Por isso, penso que cada época estamos mais perto, as pessoas acreditam mais no nosso projeto e esse é a forma certa para alcançarmos esse objetivo.

A nível individual, que balanço faz desta temporada?

É complicado... Acho que nem chega à média do rendimento que eu normalmente tenho em cada época. Mas é normal, nem sempre as coisas correm como nós queremos e agora só me resta continuar a trabalhar e tentar melhorar no futuro, sempre dando o máximo que puder. 

Um tema que tem estado muito em voga no futebol europeu é o Ramadão. No seu caso pessoal, como jogador que neste momento cumpre esse ritual, de que forma o jejum influencia o seu rendimento desportivo?

Sinceramente, eu acho que não me influencia em nada. Eu sinto-me bem, à vontade para fazer a minha vida normal, a treinar e a jogar não tenho qualquer tipo de problema, mas isso sou eu. Não quer dizer que outros reajam da mesma forma. Cada corpo é um corpo e há companheiros que podem sentir outra coisa. Como muçulmano que sou, sei que não se impõe a ninguém dificuldades que não se podem suportar. Nós cumprimos o Ramadão sempre com a consciência de que não podemos ir além dos nossos limites. Se assim for, penso que não haverá problema nenhum.

O Ramadão é algo que vem de dentro, ou seja, da nossa crença. Lembro-me que na minha infância ficava o dia sem comer e tal, mas quando a fome começava a chegar...Ui! Os meus pais acabavam por me dar de comer. (risos)"

Faz alguma preparação pessoal antes de entrar neste período?

Não, isto é algo que vem de dentro, ou seja, da nossa crença. Felizmente viemos preparados, pois os nossos pais vão habituando-nos a este ritual desde miúdos. Lembro-me que na minha infância ficava o dia sem comer e tal, mas quando a fome começava a chegar...Ui! Os meus pais acabavam por me dar de comer. (risos) Assim foi até me habituar. Depois, como adultos, já percebemos melhor a questão e vamos fazendo normalmente. 

Ao longo deste trajeto esta temporada, há algum que identifique como o mais difícil?

Pessoalmente, sinto que esta época foi muito desgastante. Quanto maior for a nossa responsabilidade no balneário, mais peso temos em cima de nós. E eu, sinceramente, não posso dizer que foi determinado momento porque tudo aconteceu ao longo da temporada. Como qualquer boavisteiro, sabemos que ao durante este caminho vamos sempre sofrer, mas que no final conseguimos festejar. 

Notícias ao MinutoAos 34 anos, o capitão é uma das figuras do clube e um dos mais acarinhados pela massa associativa.© Global Imagens

E o mais inesquecível? 

Eu diria que em todas as épocas dizemos que a festa que fazemos no final é melhor do que a do ano anterior. Possivelmente, na próxima iremos achar que superou a deste ano... É sempre assim. Portanto, acho que é importante continuarmos assim, com as festas a superarem-se, pois é sinal de que temos motivos para as fazer.

Fazendo aqui uma retrospetiva da sua carreira, por exemplo desde o momento em que representou o Sertanense, em 2009/10, naquela que foi a sua segunda época em Portugal - a primeira foi um ano antes, ao serviço do Águeda -, que companheiros o marcaram mais?

(risos) Tive alguns engraçadinhos... Normalmente falamos dos mais recentes, mas apanhei alguns com quem fiz uma enorme amizade. Felizmente tive a sorte de construir uma boa relação em todos os clubes onde joguei cá em Portugal. Ainda hoje falo com muitas pessoas com quem me cruzei ao longo da minha carreira, amigos espetaculares que muito me ajudaram, homens com 'H' grande. 

Se tivesse que dar um conselho ao Idris que chegou ao nosso país em 2008, com apenas 23 anos, o que lhe diria?

Diria para seguir sempre o foco da sua cabeça, para trabalhar sempre no máximo e não esperar nada de ninguém no mundo do futebol. Diria ainda para ser ele próprio, pois tudo o que alcançasse, seria pelo seu mérito. Claro que ninguém consegue nada sozinho e toda a gente necessita de ajuda. Mas trata-se disso mesmo: de ajuda. É apenas um 'empurrão', não é o que queremos verdadeiramente. Não nos dão nada de mão beijada. Como tal, o conselho seria esse: trabalhar e acreditar em si.

Primeira vez que defrontei o FC Porto pelo Sertanense? Lembro-me que íamos naquele autocarro pequeno e mal chegámos ao Porto apareceram motas da polícia para afastar o trânsito e nos fazer escolta. Só pensámos: 'Uiiiii, assim até nos sentimos grandes!'" (risos)

Foi essa 'estratégia' que o levou a acreditar que iria chegar ao principal escalão e a um clube histórico como o Boavista?

Eu sempre acreditei! Agora que tudo aconteceu, pode ser mais fácil falar. Mas ainda bem que sempre que falo existem testemunhas, pois sabem que eu sempre disse que tinha que chegar à Primeira Liga. Eu meti na cabeça que nem que jogasse só um ou dois jogos, mas que tinha obrigatoriamente que lá chegar. 

Aquele jogo frente ao FC Porto, para a Taça de Portugal, no Dragão, em 2009, com a camisola do Sertanense, foi o primeiro sinal de que esse sonho estava cada vez mais perto?

Sim, são sensações muito especiais. Eu lembro-me que nós íamos naquele autocarro pequeno e mal chegámos ao Porto apareceram motas da polícia para afastar o trânsito e nos fazer escolta. Só pensámos: 'Uiiiii, assim até nos sentimos grandes!' (risos) São recordações bonitas. Agora parece que é tudo normal, mas foi fantástico viver aquele momento no Dragão, com todo o ambiente a que nós não estávamos habituados. 

Essa progressão, sempre em sentido ascendente, valoriza ainda mais a sua carreira?

Eu acho que é um trajeto diferente. Não quer dizer que seja mais fácil começar num clube grande e depois passar por outros menores. Mas não é a mesma coisa. Conseguimos estar mais orgulhosos de nós próprios se soubermos que foi com o nosso sacrifício, esforço e suor que atingimos uma determinada meta. 

No Sertanense chamavam-me 'tubarão do Senegal'. Ali no meio-campo 'varria' tudo. Muitas vezes, quando me chateava nos treinos, com aquelas 'picardias' normais, usava pitons de alumínio e eles: "Eh lá... O 'tubarão de Senegal' vai atacar!'" (risos)

Tive conhecimento de um suposto alcunha que lhe deram no Sertanense. Lembra-se?

(risos) Hmmm... 'Cabeçasso'? 

Não. Qualquer coisa do Senegal...

Ahhhhhh! Tubarão do Senegal! (risos) É verdade, é verdade! 

Como é que surgiu?

(risos) Como sabemos, o tubarão é um animal forte e eu era um pouco assim. Ali no meio-campo 'varria' tudo. Muitas vezes, quando me chateava nos treinos, com aquelas 'picardias' normais, usava pitons de alumínio e eles: "Eh lá... O 'tubarão de Senegal' vai atacar!' (risos) E assim ficou... Eram brincadeiras bem porreiras. É sempre bom recordar.

Jogador duro? Talvez até pela posição que ocupo no campo, precise de marcar o meu território e de demonstrar alguma firmeza. Mas nunca é por maldade. É, sim, para me fazer mostrar aos adversários, de forma a que eles percebam que para passar têm que pedir permissão." (risos)

Nem de propósito... Muita gente diz que o Idris é um jogador duro. Como lida com essa opinião?

Eu acho que cada um tem que se conhecer a si próprio. Eu conheço-me bem e sei que dentro de campo, seja em treino ou em jogo, me transformo. Não sei ter um meio termo. Eu faço as coisas a sério, até a brincar gosto de ser sério. Talvez até pela posição que ocupo no campo, precise de marcar o meu território e de demonstrar alguma firmeza. Mas nunca é por maldade. É, sim, para me fazer mostrar aos adversários, de forma a que eles percebam que para passar têm que pedir permissão. (risos)

Também sei que médio-defensivo nem sempre foi a sua posição, correto?

É verdade! No Sertanense, o mister José Bizarro colocava-me a ponta-de-lança. E fazia golos! (risos) Quando o jogo estava complicado para nós, ou porque estávamos a perder ou por em inferioridade numérica, só me dizia: 'Bora, para a frente'. E eu lá ia...

E gostava?

Gostava! Só tinha que esperar que eles lá metessem a bola. Como sou alto, sempre que isso acontecia, conseguia causar perigo no jogo aéreo. Como era durante pouco tempo, tentava ao máximo fazer o meu melhor.  Felizmente marquei algumas vezes, pois começávamos a fazer o tal jogo direto e havia sempre uma bola de cabeça, um ressalto... Era bom.

Notícias ao MinutoMédio-defensivo cumpre a quinta temporada consecutiva ao serviço do Boavista.© Global Imagens

Está há 11 anos em Portugal e ao longo deste período já assistiu a muitos episódios no nosso futebol. Como vê este clima de 'guerrilha', especialmente nos três 'grandes'?

Eu acho que há duas partes distintas: uma é quando somos beneficiados e a outra quando somos prejudicados. O futebol é um jogo de polémica, haverá sempre, mesmo com VAR's, tecnologias e métodos que auxiliem os árbitros. Se isso não não acontecer, se não houver essa discussão sobre se é ou não penálti, se há ou não fora-de-jogo ou se o vermelho foi bem ou mal mostrado, o futebol deixa de ter a sua real emoção, que todos nós amamos. O problema é que muitas vezes ultrapassam-se os limites. Temos que perceber que somos humanos e que erramos. Eu, enquanto jogador, por vezes erro um passe ou um remate. Um árbitro ou um treinador também podem errar. 

Atualmente joga no Boavista, um histórico do futebol português, mas também já representou equipas de escalões inferiores, como já falámos. Tendo em conta essas diferentes experiências, existe ou não tendência para, em caso de dúvida, beneficiar os clubes com maior dimensão?

Normalmente... Claro que em todas as regras há exceções, mas por norma 'cai' sempre para o lado dos 'grandes'. 

Apesar de todas as dificuldades, hoje, aos 34 anos, tem a carreira que sonhou?

Bem, que sonhei... Não diria que é a que sonhei, mas também não me arrependo de nada. Talvez também pensasse que poderia chegado a um patamar mais elevado, mas orgulho-me do que fiz e das opções que tomei. Eu sempre fui ambicioso. Mesmo agora penso que posso ainda dar um pouco mais. Mas estou bem e feliz na mesma.

O que me falta conquistar? Ser campeão pelo Boavista!"

O que lhe falta ainda conquistar?

Falta-me ser campeão aqui no Boavista! 

Tem mais um ano de contrato com os axadrezados. O que pode revelar aos adeptos sobre o seu futuro?

As decisões são sempre difíceis para um jogador. Eu não posso estar aqui a dizer que vou ficar. Essa terá que ser uma opção tomada em consonância com todas as partes. Vamos sentar-nos, falar e depois logo vemos.

Acredito que ainda pretenda jogar vários anos, mas já pensa no que poderá fazer depois do futebol?

Eu espero que sim... (risos) Todos pensamos no que realmente poderemos fazer no futuro. O que me move é exclusivamente pensar que o que tenho, o que me falta ou o que quero está nas mãos de Deus. Eu não sei o que vai acontecer de hoje para amanhã. Por isso, não posso dizer que tenho este ou aquele plano. Obviamente que tenho ideias, até relacionados com o futebol, mas vou deixar passar o tempo, dia a dia, e quando lá chegar logo vejo.

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