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"Isto não pode continuar dormente como esteve durante 40 anos"

Leonel Vieira é o produtor do filme 'Perdidos', que estreou esta quinta-feira, o primeiro 'thriller' em língua portuguesa. O realizador falou com o Notícias ao Minuto e explicou porque decidiu enveredar pelo remake e quais são os seus planos para o futuro.

Notícias ao Minuto

08:30 - 19/05/17 por Anabela de Sousa Dantas

Cultura Leonel Vieira

Leonel Vieira não queria fazer um remake, queria um guião original para fazer o primeiro ‘thriller’ português, mas não encontrou quem o escrevesse como deve ser. ‘Perdidos’, uma adaptação de ‘Open Water 2: Adrift’ (2006), nasce, assim, do esforço de uma produção que não quis desistir do desafio.

O realizador natural de Miranda do Douro explicou, em conversa com o Notícias ao Minuto, como há, em Portugal, “falta de ‘know-how’ na área do guionismo” e como duvidaram de si quando disse que ia produzir em cenário real um filme cuja ação se passa no mar.

Quando o orçamento apresenta limitações resta a vontade. E o filme saiu, com mais “força, verdade e intensidade” do que o original. Porque a Leonel, conforme o próprio diz, sobra-lhe a coragem de que o cinema português carece. Coragem essa que promete manter, no cinema, em Portugal e além-fronteiras.

Como surgiu a ideia de fazer um remake de ‘Open Water 2: Adrift’?

A ideia que tive há uns três ou quatro anos não foi a ideia de um remake. Eu sou um apaixonado pelo thriller e quando estava a produzir a trilogia das comédias [‘O Pátio das pCantigas’, ‘O Leão da Estrela’ e ‘A Canção de Lisboa’], toda a gente me perguntava qual era a próxima comédia que eu ia produzir, como se a minha vida toda tivesse produzido comédias...

Bem pelo contrário, não é?

Bem pelo contrário. E eu dizia que não, não acho que o meu próximo filme seja uma comédia. Estava já na altura a pensar fazer qualquer coisa que fosse completamente contrária à comédia e como achava que o único género que em Portugal não tinha sido produzido era o ‘thriller’, pensei em fazer um.

Tentei encomendar guiões em Portugal para um 'thriller' original, não foi possível, ninguém conseguiu escrever um 'thriller'Era um desafio pessoal, estar envolvido na produção de um ‘thriller’?

Era um desafio pessoal, exatamente. Aliás, acho que a forma como me meto a fazer filmes, embora às vezes sejam projetos que me propõem, argumentos que me trazem… encaro como um desafio. Motiva-me que não sejam projetos fáceis de fazer.

Agora findo este projeto, que conclusões é que tira?

Olhe, é muito simples, tentei encomendar guiões em Portugal para um ‘thriller’ original, não foi possível, ninguém conseguiu escrever um ‘thriller’. Mesmo agora estou à procura para um outro projeto e não é fácil. As pessoas não conseguem escrever um ‘thriller’ e a razão para eu procurar um projeto internacional foi mesmo a falta de um guião do género que fosse satisfatório. E por falta de ‘know-how’ em Portugal na área do guionismo. É uma área em que, de facto, não temos muita tradição.

Não há aposta em formação nessa área.

Não há aposta na formação, de facto. Nenhuma aposta na formação. Acabei por encontrar este projeto com um amigo meu, em Paris, e estavam disponíveis para vender os direitos. Não era só encontrar o projeto, é preciso que os produtores estejam disponíveis para vender os direitos de adaptação. E ao mesmo tempo ser o tipo de projeto para o qual eu teria condições de produção, porque há outros projetos que eu gostaria de fazer mas não teria orçamento.

É só o primeiro filme do género em Portugal. Para primeiro filme não está nada mal, acho que até nos saímos muito bemOs dois filmes desta série (‘Open Water’, de 2003, e ‘Open Water 2: Adrift’) são conhecidos precisamente pelos argumentos muito intensos mas low-budget…

Exatamente, era isso que eu queria. Que as condições de produção não afetassem a qualidade do filme. E neste projeto até achei que poderia fazer melhor, agora que o acabei acho que fiz um bom trabalho. Discutimos muito o guião, melhorámos as personagens, resolvemos problemas que eu achava que o guião tinha… acho que foi um desafio, foi uma aprendizagem e foi uma superação. Até porque, vou-lhe dizer uma coisa, este tipo de filmes, de água, de mar, de barco, são sempre produzidos em tanques de água e são sempre orçamentos muito caros. E eu sabia que não teria orçamento para filmar num tanque de água.

Mesmo assim achei que o conseguia produzir e corri o risco de o produzir como ninguém o produzia, em condições reais, em alto mar. E lembro-me de muita gente me dizer que não ia dar. E eu achei que não só ia conseguir como lhe ia atribuir um realismo e uma força que os outros filmes não tinham. E é isso, este filme tem uma força, uma verdade e uma intensidade que os outros filmes não têm. Provei que era possível produzir em condições que os outros não conseguiam. Foi uma aprendizagem, foi um desafio e é só isso, é só o primeiro filme de género em Portugal. Para primeiro filme não está nada mal, acho que até nos saímos muito bem.

E se o Leonel tivesse um budget mais alargado, o que faria a seguir?

O que faria, não, o que vou fazer. Vou fazer muita coisa. Vou trazer um ‘thriller’, vou trazer mais coisas. Muitas surpresas.

Quer apostar nesta área?

Quero, não, estou a apostar. Não gosto de falar do que vou fazer, só gosto de falar do que estou a fazer. (…) Tenho vários projetos e várias surpresas. Vêm aí várias surpresas, bastante diferenciadas, que o nosso cinema não tem muita coragem de fazer e enquanto eu tiver coragem e saúde... Só preciso é de saúde, coragem tenho sempre, para fazer aquilo em que acredito e arriscar.

Para mim isto é uma aprendizagem, faço isto porque eu aprendo e ao mesmo tempo estou a dar um caminho, outros virão atrás de mim e vão fazer melhor. Mas estou a contribuir para abrir um caminho.

Para agitar o mercado do cinema português?

Para expandir o horizonte, isto não pode continuar dormente como esteve durante 40 anos. Enquanto eu puder, não vai ser assim.

Enquanto não conseguirmos contar histórias na nossa língua para o nosso país inteiro, nós não estamos em paz com o país.A trilogia de comédias que fez teve muito sucesso. O ‘Pátio das Cantigas’ teve 600 mil espetadores…

Teve 610 mil espetadores, é o filme mais visto da história do cinema português. E com 30 mil DVD’s vendidos que é também extraordinário.

Foi o apelo do clássico a trazer este sucesso, a comédia, ou os dois?

Se eu soubesse isso, garanto-lhe que estava milionário. Ia trabalhar para os americanos [risos]. Faço coisas em que acredito e tento interpretar em cada momento coisas que julgo que o público vai gostar. Mas é uma interpretação completamente intuitiva, não tem fórmula nenhuma.

Gosto de interpretar o grande público, não olho com o meu gosto pessoal, o meu gosto pessoal é outro. Não penso no meu gosto pessoal quando faço filmes para as salas. Tenho uma produtora para fazer filmes para o país inteiro e, se possível, não é só para o país, gostaria de fazer filmes para outros países e para vários mercados. Essa é a minha ambição. Enquanto não conseguirmos contar histórias na nossa língua para o nosso país inteiro, não estamos em paz com o país. E aí vamos crescer...

O filme ‘Mulheres’ [estreia no final do verão deste ano] já se enquadra nessa sua ambição?

É o primeiro filme da nossa história que vai ser lançado como um ‘blockbuster’ da língua portuguesa. Ou seja, lançado no Brasil, Portugal, Angola e Moçambique, no maior circuito comercial da língua portuguesa. Não é no circuito de autor, é no maior circuito comercial da língua portuguesa.

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