Dia da morte de Catarina Eufémia "para sempre em aberto" em livro
O jornalista Pedro Prostes da Fonseca reconstituiu a história da morte de Catarina Eufémia em 1954, em Baleizão, Beja, mas admite que ficará "para sempre em aberto" a dúvida sobre se o tenente da GNR a matou de forma voluntária.
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"É um assunto que ficará para sempre em aberto, mas nunca será o mais decisivo", escreveu o jornalista Prostes da Fonseca logo na introdução do livro "O Assassino de Catarina Eufémia" (Matéria-Prima Edições), que será apresentado na segunda-feira, em Lisboa, e em que revela documentos inéditos como os dos procedimentos judiciais e o acórdão que absolveu o oficial da GNR João Carrajola.
O jornalista destacou a "forma complacente" como o "juiz deu como provado que, na manhã do dia 19 de maio de 1954, no Monte do Olival, João Tomás Carrajola encostou o cano de uma pistola-metralhadora nas costas de uma trabalhadora rural" e que da pistola "saiu uma rajada de três tiros que estilhaçou o corpo da camponesa" de 26 anos.
Depois de uma investigação nos Arquivos Histórico Militar e da GNR e que também incluiu entrevistas à filha e a uma amiga de infância de Catarina Eufémia, o autor confessa o que mais o chocou no caso da camponesa de Baleizão.
O que "mais choca", escreveu Pedro Prostes, é a forma como a justiça, em pleno regime ditatorial de Salazar, teve a certeza de que o tenente da GNR "não carregou no gatilho" da espingarda e como o acórdão o absolveu, contradizendo o que tinha sido apurado em inquérito.
Choca-o ainda "terrível nódoa" do louvor atribuído pela GNR a João Carrajola poucos anos depois dos acontecimentos em Baleizão.
Se Prostes da Fonseca não retira conclusões, o advogado Ricardo Sá Fernandes, que assina o prefácio, assinala que esta é uma obra "intelectualmente honesta", que "não toma partido", mas "procura ir ao fundo do que aconteceu".
"Não é uma obra apaixonada que pretenda impor um ponto de vista. É por isso que é especialmente eficaz a demonstrar que, no caso de Catarina Eufémia, terá sido cometido, no mínimo, um homicídio por grosseira negligência", argumentou.
Ao longo de mais de 200 páginas, Pedro Prostes da Fonseca traça o perfil de Catarina Eufémia, que inspirou poetas como Ary dos Santos ou Sophia de Mello Breyner, faz, quase hora a hora, a cronologia do dia da morte da camponesa, e descreve o que eram as dificuldades da vida no Alentejo na década de 50 do século passado.
O livro apresenta vários anexos, incluindo o "fac-simile" do acórdão do julgamento de Carrajola, o relatório da autópsia a Catarina Eufémia, além das entrevistas a Maria Catarina, filha da camponesa de Baleizão, e a Mariana Cascalheira, amiga de infância.
A militância, ou não, de Catarina Eufémia no PCP é também abordada no livro.
A filha, Maria Catarina, afirma que a mãe nunca foi filiada no PCP -- "na altura nem havia inscrições nos partidos" --, mas a verdade é que Catarina Eufémia andava com a filha pela mão nas ruas da aldeia de Quintos, perto de Baleizão, a distribuir "papéis do partido, os avantes!".
Catarina Eufémia, cantada por Zeca Afonso e um símbolo da resistência antifascista, é anualmente lembrada por sucessivos secretários-gerais do PCP.
Em maio de 1974, escassos dias depois do 25 de Abril, no regresso do exílio, Álvaro Cunhal foi a Baleizão: "Catarina morreu como deve saber morrer um membro do partido. Morreu à frente das massas, encabeçando a luta de classe, defendendo os interesses vitais dos trabalhadores. Morta, continuou a servi-la pelo seu exemplo."
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