Premiado com o Nobel da Literatura de 2025, "pela sua obra convincente e visionária que, no meio do terror apocalíptico, reafirma o poder da arte", László Krasznahorkai tornou-se hoje o segundo autor húngaro a conquistar o mais importante prémio literário do mundo, depois de Imre Kertész ter conseguido esse feito em 2002.
Apesar do segredo que circunda sempre o vencedor até à hora do anúncio, as casas de apostas davam o escritor húngaro, de 71 anos, como o favorito, sendo conhecido por romances difíceis e exigentes, frequentemente rotulados de pós-modernos, com temas distópicos e melancólicos.
Nascido em 1954 numa pequena cidade remota do sudeste da Hungria, perto da fronteira com a Roménia, Lázló Krasznahorkai ambientou o seu primeiro romance, 'O Tango de Satanás', numa região rural semelhante, para contar a história de um grupo miserável de habitantes de uma quinta coletiva abandonada no campo húngaro, pouco antes da queda do comunismo.
Reinam o silêncio e a expectativa, até que reaparecem duas personagens, que tinham sido dadas como mortas, e que são recebidas como mensageiras de esperança, por alguns moradores, ou como demónios, por outros.
A crítica norte-americana Susan Sontag coroou cedo Krasznahorkai como o "mestre do apocalipse" da literatura contemporânea, um juízo que formulou após ler o seu segundo livro, 'Az ellenállás melankóliája' ('A Melancolia da Resistência'), uma fantasia febril e aterradora, passada numa pequena cidade húngara situada num vale dos Cárpatos, onde o drama atinge proporções ainda mais intensas.
Com cenas de natureza onírica e personagens grotescas, László Krasznahorkai retrata aqui a luta brutal entre a ordem e o caos - uma luta de que ninguém sai ileso.
Estes seus dois primeiros romances foram transformados em longas-metragens pelo realizador húngaro Béla Tarr, que, a partir de 1988, realizou todos os seus filmes em parceria com László Karsznahorkai, o último dos quais "O Cavalo de Turim".
No seu romance 'Háború és háború', Krasznahorkai desloca a sua atenção para além das fronteiras da Hungria, acompanhando o humilde arquivista Korin, que decide, como derradeiro ato da sua vida, viajar dos arredores de Budapeste até Nova Iorque para, por um instante, ocupar o centro do mundo.
Neste livro, a prosa de Krasznahorkai já evolui para a sintaxe fluente e longas frases serpenteantes, desprovidas de pontos finais, que se tornariam a sua marca distintiva.
A estes "épicos apocalípticos" junta-se um outro 'Herscht 07769: Florian Herscht Bach-regénye', um romance que retrata uma pequena cidade contemporânea da Turíngia, na Alemanha, igualmente assolada por anarquia social, homicídios e incêndios.
Este romance, que foi descrito como um grande romance alemão contemporâneo, pela precisão com que retrata a agitação social do país, será publicado em Portugal já no próximo dia 13 pela Cavalo de Ferro, antecipando a data inicialmente prevista, devido à atribuição do prémio.
Florian Herscht é um gigante meigo e ingénuo, visto pelos habitantes de Kana como o idiota da aldeia, que está convencido de que o mundo se aproxima do fim e é sobre o perigo de uma catástrofe iminente que escreve cartas obsessivas à chanceler Angela Merkel, ao mesmo tempo que trabalha numa empresa de lavagem de paredes sob a alçada de Boss, o líder de um grupo neonazi local e fanático por Johann Sebastian Bach.
Trata-se, nas palavras da editora, de uma "sátira devastadora e profética sobre a desintegração social e o colapso ecológico, o nacionalismo e o globalismo, e a linha ténue que separa a civilização da barbárie", numa única frase vertiginosa ao longo de quase 400 páginas, no estilo inconfundível de Krasznahorkai.
Mas o escritor também se voltou para o Oriente, adotando um tom mais contemplativo que deu origem a uma série de obras inspiradas nas impressões profundas deixadas pelas suas viagens à China e ao Japão.
Desde que se lançou na escrita, Krasznahorkai tem recebido elogios internacionais dos críticos, que o comparam a Gogol e Melville.
Na opinião do escritor alemão W.G. Sebald "a universalidade da visão de Krasznahorkai rivaliza com a das 'Almas Mortas' de Gogol e ultrapassa em muito todas as preocupações menores da escrita contemporânea".
Lázló Krasznahorkai ganhou em 2015 o Prémio Man Booker Internacional, tendo sido o primeiro autor húngaro a ser distinguido com esse prémio.
Depois de vários anos a residir em Berlim, na Alemanha, Krasznahorkai retirou-se para as colinas de Szentlászló, na Hungria.
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