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'Malcriado' de Vicente Alves do Ó é a história da sua infância

"Malcriado", o novo filme de Vicente Alves do Ó, que começou esta semana a ser filmado no Montijo, passa-se em 1982, e conta a história da infância do próprio realizador e do seu refúgio na arte.

 'Malcriado' de Vicente Alves do Ó é a história da sua infância
Notícias ao Minuto

23:27 - 13/08/22 por Lusa

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A história passa-se no ano de 1982, numa cidade inventada, que pode ser qualquer cidade portuguesa, sobre um menino de dez anos, chamado Vasco, fruto de uma relação extraconjugal, que vive com a mãe, solteira e cabeleireira, sonha com a série "Espac¸o 1999", dorme num sofá-cama, não conhece pessoalmente o pai mas tem imensa curiosidade, contou o cineasta à agência Lusa.

Foge de casa para brincar na rua, rouba a carteira da mãe para lhe oferecer flores, adora a avó, tem medo dos cavalos, mas, acima de tudo, tenta sobreviver a um quotidiano sem regras, sem futuro, sem princípios e, por vezes, sem razão.

Durante um ano, assiste-se ao desenvolvimento do rapaz, o seu crescimento e enamoramento pelas coisas das artes e em especial do cinema e da literatura.

"É a história de uma infância que descobre a arte, a magia, a fantasia da criação, e mistura isso tudo com a vida real que ele tem, que é uma vida um bocadinho difícil, tendo em conta que não tem pai, não vive com o pai, e tem uma mãe um bocadinho 'sui generis' e 'fora da caixa'", revelou Vicente Alves do Ó, que é também o argumentista.

Ao longo do filme, o grande sonho de Vasco, que acaba por concretizar no fim, é conseguir passar um dia com o pai, um homem que não conhece e quer conhecer, que vive na terra, que toda a gente conhece e com quem ele não tem ligação nenhuma.

Mas para o realizador, que já fez vários 'biopics', o último dos quais sobre o pintor "Amadeo", e que se estreia no final do ano nos cinemas, o mais fascinante é o momento em que as pessoas conhecem a sua vocação de vida, depois de passarem uma infância a sonhar ser muitas coisas.

Esse é um tema que trabalha neste filme, através da criança que, para fugir à realidade, vai-se dedicando "a estas coisas da arte e da fantasia, que de alguma forma o alimentam e fazem sobreviver a uma história com a qual não sabe lidar".

"É a minha história" -- confessa -, "é a minha infância, ou seja o filme passa-se em 1982, eu tinha dez anos, eu peguei na minha história real e transformei-a neste filme, pode-se dizer que é baseada em personagens reais e factos verídicos. Usei o material que tenho, o material que conheço, e depois de ter feito os 'biopics' apetecia-me imenso fazer uma coisa que me dissesse muito respeito a mim".

O realizador acredita que todos têm um filme dentro da sua vida para contar, e decidiu contar a sua em "Malcriado", mas também pretendeu "espelhar um bocadinho dos anos 80, falar de uma época analógica que de repente já é uma recordação, a forma como este miúdo vive, anda de bicicleta na rua, passa o dia a brincar na rua, ninguém se preocupa, brinca nas obras, anda com os outros miúdos todos, ninguém está preocupado se ele é roubado, se é raptado, o que é que acontece, se tem uma ferida, se se aleija ou não, há uma liberdade aqui que nós ainda vivemos, pelo menos as pessoas com mais de 40 anos, viveram nos anos 80, e eu também queria resgatar isso, esse tempo, e trazer esse tempo para o cinema".

É deste modo que "Vasco, que no fundo é o Vicente, conta um bocadinho dessa infância, desses sonhos, dessa fantasia de ser cineasta e de ser escritor e de ser santo e de ter um cavalo, e que volta e meia queria ser uma coisa diferente".

"O filme passa por esse imaginário e tenta demonstrar como é que às vezes se formam estas pessoas, em que me incluo, que são pessoas um bocadinho inquietas e que nunca perdem o desejo de inventar, de mentir, e aqui é a mentira do cinema, de ter sempre esta vontade de querer acrescentar alguma coisa ao mundo real. É o que temos para dar ao mundo e os filmes é o que eu tenho para dar ao mundo, e a minha própria historia também é aquilo que eu tenho para dar ao mundo".

"Malcriado" vai ser filmado na zona do Montijo, na zona de Sintra e na zona de Alvalade-Sado, no Alentejo, perto do Cercal do Alentejo.

A cidade imaginária passa-se entre Montijo e Alcochete e depois há um período no verão em que Vasco viaja para o Alentejo para passar férias com os avós, tal como Vicente Alves do Ó passava as férias escolares em casa da avó - "uma típica mulher alentejana vestida de preto, muito mal dispota" --, um tempo que ainda guarda "com muito carinho".

As filmagens vão decorrer durante cinco semanas, e estão previstas terminar em meados de setembro.

"Se tudo correr bem, na primavera de 2023 estamos a estrear".

A escassez de orçamento é a principal dificuldade com que o cineasta se confronta, sobretudo por se tratar de uma reconstituição histórica, o que envolve sempre um bocado mais de produção e trabalho, para que as coisas tenham um ar profissional e fiquem bem feitas.

"A dificuldade aqui é esconder a modernidade quando estamos a filmar, especialmente nos exteriores", porque apesar de os anos 1970 e 1980 não serem particularmente difíceis de reconstituir, há sinaléticas, mobiliário urbano, alguma construção, os automóveis, muita coisa que mudou e que é preciso substituir.

Orçamentado em cerca de 700 mil euros, o filme "Malcriado" recebe a maior fatia de apoio do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA), no valor de 600 mil euros.

Contará ainda com algum apoio financeiro da RTP e outros apoios logísticos, nomeadamente da Câmara Municipal do Montijo e de algumas empresas.

O filme, produzido pela Ukbar Filmes, terá Rita Loureiro e Kevim Vicente nos principais papéis.

O elenco conta ainda com os atores Ana Bola, Rita Lello, Luciano Gomes, Miguel Damião, Rafael Morais, Raquel Rocha Vieira, Ana Vilela da Costa, Rute Miranda, Valerie Braddell e Inês Sá Frias.

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