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Exposição mostra 'Vidas Esquecidas' de um dos piores campos de refugiados

Dulce Machado foi voluntária no campo de refugiados de Moria em Lesbos (Grécia) e, além dos fortes laços emocionais que estabeleceu, captou as imagens das "vidas esquecidas" que sobrevivem neste campo já caracterizado como um dos piores no mundo.

Exposição mostra 'Vidas Esquecidas' de um dos piores campos de refugiados
Notícias ao Minuto

10:20 - 01/12/19 por Lusa

Cultura Fotografia

Vidas de milhares de refugiados (homens, mulheres e muitas crianças) a viveram em condições muito precárias e difíceis que Dulce Machado quer mostrar, "porque as pessoas têm de ver que estas estórias têm rostos", numa exposição de fotografia (sob o nome 'Vidas Esquecidas') que inaugura na próxima quinta-feira (dia 05 de dezembro) em Carnide (Lisboa).

Durante o mês que fez voluntariado no campo de Moria, em agosto de 2019, esta antiga professora do primeiro ciclo tirou cerca de 5.000 mil fotografias, destas selecionou cerca de 200.

"Tive contacto com inúmeras vidas, cada vida entra em nós (...) Trago-as todas comigo", afirmou à Lusa a antiga docente, confessando que a seleção não foi fácil "porque cada fotografia é uma vida".

Não foi a primeira vez que Dulce Machado esteve num campo de refugiados na Grécia -- já em 2018 tinha feito voluntariado no campo de refugiados de Elefsina, nos arredores de Atenas -- mas o que viu e ouviu em Moria foi uma experiência marcante e sobre a qual faz questão de falar.

"Estórias dramáticas, muito dramáticas. Crianças que se tentam suicidar, mulheres que são violadas e que foram violadas, torturas...", relatou.

"As condições são inimagináveis. As pessoas vivem como se fossem quase animais e, de facto, são vidas esquecidas, porque elas estão ali", referiu a voluntária, defendendo que, tanto os governantes europeus e mundiais como a sociedade civil, precisam de olhar para estas pessoas, que são "completamente depositadas" nestes campos.

Em Moria, um campo com uma capacidade para cerca de 3.000 pessoas mas que atualmente alberga mais de 11.000, os refugiados enfrentam, segundo descreve Dulce Machado, inúmeras dificuldades, nomeadamente no acesso a alimentos e de água potável e nas condições de saneamento, e diversos perigos.

Um dos episódios que relata é que muitas mulheres em Moria dormem de fraldas para evitarem irem de noite às casas de banho do campo, porque correm o risco de serem violadas.

O título da exposição revela as "vidas esquecidas" das pessoas que permanecem durante longos meses em Moria, mas, de acordo com a voluntária, pode ter outro sentido: lembrar que muitos destes refugiados tiveram, a dada altura, vidas estruturadas nos respetivos países e que essas também ficaram para trás.

Entre as muitas estórias e os muitos rostos que marcaram, e que continuam a marcar, a vida desta antiga professora está uma família oriunda do Irão.

Vítima de perseguição política e religiosa, o pai da família, "um jogador profissional de futebol, que chegou a ser jogador da seleção do Irão", perdeu tudo porque assumiu o amor por uma mulher de outra religião, segundo conta Dulce Machado.

"Tiveram de fugir. E a vida dele de repente, de um dia para o outro, ficou resumida a um campo de refugiados", prosseguiu a voluntária, acrescentando que já em pleno campo de Moria nasceria o filho do casal.

"Foi algo que me marcou muito e continuo a ter ligação com eles e a saber deles, porque sou incapaz de os deixar para trás, não sou capaz", afirmou.

O Governo grego anunciou recentemente que pretende substituir os campos de processamento e de acolhimento de refugiados em algumas ilhas gregas, nomeadamente em Lesbos (no Mar Egeu), por novas estruturas, que funcionarão em regime de detenção.

Atenas justificou o plano com o aumento do fluxo de requerentes de asilo na Grécia verificado nos últimos meses, mas também com a degradação verificada das condições de vida nos campos de refugiados.

Dulce Machado acredita que estes novos centros em regime de detenção "não são uma solução" e que serão "prisões".

"Um campo de refugiados já é o que é, não tem condições nenhumas. E em vez de arranjarem uma solução para que estes campos tenham melhores condições, para que as pessoas que vivem lá, que sobrevivem lá, tenham melhores condições. O que é que eles vão fazer, vão prender estas pessoas lá dentro", afirmou a voluntária, defendendo que a solução passa por integrar estas pessoas, nomeadamente no mercado laboral, e por uma maior rapidez dos processos burocráticos.

Estas pessoas "podem contribuir com tanto", concluiu Dulce Machado, que, após uma carreira de mais de duas décadas no ensino, está a tirar atualmente uma pós-graduação em ação humanitária, algo que quer fazer para "o resto da vida".

Em setembro passado, Moria foi cenário de um incêndio e de tumultos e, segundo a organização Médicos Sem Fronteiras, pelo menos dois menores morreram nos últimos três meses neste sobrelotado campo de refugiados, devido às condições perigosas do espaço e pela falta de cuidados adequados.

A exposição "Vidas Esquecidas" estará patente ao público até 10 de dezembro.

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