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Livro esclarece atuação do comandante da fragata Gago Coutinho em 1974

O comandante da fragata, que no dia 25 de Abril de 1974 navegava em frente à Praça do Comércio, supostamente ameaçando a coluna militar liderada por Salgueiro Maia, nunca deu ordem para disparar, segundo obra publicada esta semana.

Livro esclarece atuação do comandante da fragata Gago Coutinho em 1974
Notícias ao Minuto

16:03 - 09/03/19 por Lusa

Cultura 25 de Abril

"A verdade é que o comandante [António Seixas Louçã] nunca deu ordem para que se disparasse sobre as tropas estacionadas no Terreiro do Paço", afirma a sua mulher, Noémia Louçã, autora da obra "Uma Fragata no 25 de Abril", publicada pela Parsifal.

A versão de que a fragata, batizada Gago Coutinho, não disparou contra as tropas comandadas por Salgueiro Maia, porque a sua guarnição se opôs ao comandante, que tinha recebido ordens superiores, "é falsa", atesta a autora, apresentando como prova "os resultados de inquéritos [realizados] a seguir à revolução, que incluem depoimentos feitos e subscritos por intervenientes, designadamente os oficiais da fragata".

Noémia Louçã escreve que a versão segundo a qual a guarnição evitou que abrisse fogo, nomeadamente a intervenção do imediato Caldeira dos Santos, "é criada pela imaginação dum jornalista para causar sensação".

A autora cita testemunhos, segundo os quais, quando recebeu ordem para fazer fogo, o comandante Seixas Louçã "opôs imediatamente objeções a quem lha transmitiu e, alegando existirem cacilheiros no rio e muitos civis no Terreiro do Paço [oficialmente denominado Praça do Comércio], não cumpriu essa ordem".

Por outro lado, argumenta a autora, pesa igualmente o passado antifascista do comandante, desde os tempos da juventude. Noémia Louçã cita as declarações do almirante Ferraz de Carvalho que, no depoimento feito em 1976, afirmou: "Ele sempre se revelou inconformado com o tipo de regime conhecido por Estado Novo".

O almirante revelou ainda, no mesmo depoimento, que contactou Seixas Louçã para tomar parte "num movimento para derrubar o regime" em outubro de 1947, e ele "logo se prontificou, correndo todos os riscos que lhe podiam advir da sua ação".

Para a viúva, "a posição do comandante da fragata era pública e notória, impossível de ignorar pelos que lidavam com ele".

Noémia Louçã é clara nas suas intenções quanto à publicação desta obra: "Além de defender a atuação do meu marido, injustamente posta em causa, outra das motivações (...) foi lembrar o seu caráter de democrata e oposicionista à ditadura, com todo o perigo que isso representava na carreira de um militar antes do 25 de Abril de 1974".

Um aspeto, sublinha, "reconhecido por muitos dos que com ele serviram a Marinha ou com ele privaram", e que foi "completamente ignorado por alguns que o têm atacado".

Na opinião do almirante Rosa Coutinho, um dos militares da revolução, citado pela autora, o comandante Seixas Louçã "era um democrata e republicano da velha guarda, nada afeto ao regime do Estado Novo, e com excelentes relações com os democratas mais velhos".

A obra dá conta de como se viveu "os primeiros dias da revolução", e dedica um capítulo à "reabilitação que nunca chegou a acontecer", apesar de, em 1978, o Chefe do Estado Maior da Armada ter sentenciado, após várias diligências, sobre Seixas Louçã, "não ter a sua atuação no dia 25 de Abril de 1974, no comando do Navio da República Portuguesa Almirante Gago Coutinho posto em causa a sua honra e dignidade de oficial da Armada".

Outros capítulos da obra debatem, com vasto apoio documental, a ordem de fogo sobre as tropas de Salgueiro Maia, como se escusa uma ordem "sem quebra da disciplina", a "reunião com o navio fundeado no mar da Palha", "o Movimento das Forças Armadas (MFA) e a fragata Gago Coutinho, os dilemas colocados a este vaso de guerra", e "porque não houve um entendimento prévio" do MFA com a fragata.

A segunda parte, com 113 páginas, de um total de 190, é composta por vários anexos documentais, desde o "Relatório e conclusões do Auto de Averiguações de 1976", de autoria de Fernando Santos Silva, até textos de António Louçã, filho do comandante Seixas Louçã, nomeadamente "O Veredicto da Marinha sobre a fragata Gago Coutinho relido em 2014", e "Como dez oficiais se conjuraram para deturpar a verdade. Ainda a história da fragata Gago Coutinho".

Noémia Louçã, advogada, foi a primeira mulher a exercer advocacia em Moçambique, sob administração portuguesa, onde nasceu em 1931, tendo-se casado com António Seixas Lousã em 1954. Em 1988 tornou-se a primeira mulher a advogar no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, tendo ganhado uma causa contra o Estado português.

Em 1996, foi agraciada pelo então Presidente da República, Jorge Sampaio, com a Ordem do Infante D. Henrique.

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