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"Escrever com um pseudónimo faz-me sentir um pouco mais corajosa"

A britânica Phoebe Locke inspirou-se num caso real para dar corpo a ‘O Homem nas Sombras’ e fê-lo através de um pseudónimo para, revelou em entrevista ao Notícias ao Minuto, se sentir "mais corajosa".

"Escrever com um pseudónimo faz-me sentir um pouco mais corajosa"
Notícias ao Minuto

08:03 - 28/07/18 por Patrícia Martins Carvalho

Cultura Phoebe Locke

'O Homem nas Sombras' conta a história do casal Milo e Sadie que tem uma filha durante o percurso universitário. Pouco depois de a criança nascer, a mãe desaparece de casa, pois a filha foi amaldiçoada, e regressa 15 anos depois.

Entretanto, Amber cresceu e tornou-se numa adolescente mediática e a produtora-assistente de um documentário sobre a jovem é obrigada a passar algum tempo com a adolescente para a conhecer melhor e controlar as gravações.

Para escrever ‘O Homem nas Sombras’, Phoebe foi beber inspiração ao caso mediático de 2014, quando uma menina de 12 anos foi esfaqueada 19 vezes por duas crianças da mesma idade. Tudo para agradar a uma personagem fictícia da internet, o Slender Man.

Em conversa com Phoebe Locke, que esteve em Portugal para o lançamento do seu livro, editado em junho passado pela Planeta, a escritora britânica cujo verdadeiro nome é Nicci Cloke, explicou a razão de usar um pseudónimo e o porquê de ter enveredado pelo thriller depois de ter escrito romances.

Quanto à violência, a autora duvida que os videojogos e filmes sejam os únicos responsáveis pela sua proliferação, mas acredita que contribuem para uma maior insensibilidade por parte dos jovens que acabam por se acostumar à presença da violência no seu quotidiano.

Quem é Phoebe Locke e quem é Nicci Cloke?

São a mesma pessoa. A Nicci é quem eu sempre fui e a Phobe é, talvez, o meu lado mais sombrio que está finalmente a libertar-se.

É útil ter diferentes identidades para diferentes tipos de livros

Por que razão usa um pseudónimo?

Tem sido bom ter este alter-ego, pois como ‘O Homem nas Sombras’ é diferente do que já escrevi, ter um pseudónimo faz-me sentir um pouco mais corajosa. Mas não é só essa a questão. Acho que é útil ter diferentes identidades para diferentes tipos de livros. Desta forma, os leitores que acompanharam o meu trabalho anterior não vão ter uma surpresa negativa quando lerem o próximo.

Porquê escrever um thriller depois de vários romances?

Antes de ‘O Homem nas Sombras’ escrevi dois romances para jovens adultos e, apesar de ter tido a oportunidade de explorar temas mais obscuros – como o aliciamento que há na internet e os tiroteios nas escolas – a verdade é que tenho estado à espera para escrever alguma coisa mais adulta que fosse ao mesmo tempo assustadora.

Esta era então uma vontade antiga?

Sim. Eu cresci com a série ‘Point Horror’ e com os livros de Stephen King e adoro ler thrillers (devo ler uns 100 por ano) e, por isso, fazia sentido que eu quisesse escrever o meu próprio thriller.

Porquê fazê-lo só agora?

Só agora tive ideias. Li sobre o esfaqueamento relacionado com o Slender Man e tive uma ideia para o livro que acabei mesmo por escrever.

Foi difícil escrever este livro?

Em alguns aspetos foi mais fácil do que qualquer livro que já escrevi. A verdade é que assim que comecei, não consegui parar e as personagens tornaram-se reais para mim de uma forma muito rápida. No entanto, ainda demorou um pouco até que todo o enredo se encaixasse, o que é algo fundamental. Aliás, por três ou quatro vezes terminei os rascunhos e coloquei-os de parte porque sentia que faltava alguma coisa.

O que é que faltava?

Um verdadeiro elemento criminal que acabou por ser a equipa de filmagem do documentário que acompanhou Amber, uma das personagens principais nos dias atuais.

Notícias ao MinutoLivro marca a estreia da autora no thriller e já pode ser comprado em português© Planeta

Esperava tantas críticas positivas?

Não. A verdade é que o momento em que o teu livro é publicado é assustador. Ele esteve na tua cabeça durante muito tempo e não fazes a mais pequena ideia do que é que as pessoas vão achar dele. Mas tem sido ótimo ler críticas tão boas.

Muitas pessoas já me disseram que é um livro arrepiante e assustador

O que é que o leitor pode esperar desta obra?

Superficialmente é sobre o efeito que uma lenda antiga tem em duas jovens, mas espero que também explore as relações entre mães e filhas, as relações perigosas de amizade entre adolescentes do sexo feminino, a nossa obsessão pelo crime verdadeiro e pelos reality shows. Muitas pessoas já me disseram que é um livro arrepiante e assustador, mas espero que seja também um retrato de uma família fraturada e de uma rapariga traumatizada.

Em que se inspirou para dar vida a Amber?

A Amber foi um pouco inspirada em Amanda Knox – interessa-me muito como os media podem moldar a nossa perceção de uma pessoa de tal forma que nós acreditamos que é culpada ou inocente de algum crime.

Considera que os jovens estão demasiado expostos à violência e é isso que explica estes crimes?

Sim e não. Acho que todos nós estamos agora mais expostos à violência – na ficção e nas notícias – e, por causa disso, ficamos menos chocados face a essa violência do que ficaríamos se tivessemos vivido nas gerações anteriores.

Se não é a exposição que desencadeia este tipo de atos o que é?

Não estou certa que ver esse tipo de coisas leva os jovens a tornarem-se violentos. Acho que no fim de contas aquela violência vem do íntimo de uma pessoa, é uma coisa que vem da personalidade e de muitos outros fatores como as experiências do passado e até o contexto do momento presente. Mas ainda assim pergunto-me se os videojogos e os programas de televisão violentos têm influência nos mais novos e até mesmo na empatia que eles sentem ou não pelas vítimas de crimes.

Quem é o seu autor favorito?

Desde os meus dez anos que é o Stephen King devido ao seu talento para escrever genuinamente sobre o lado assustador da vida. Não creio que haja um autor no mundo com um melhor entendimento das pessoas e das coisas terríveis que somos capazes de fazer quando somos postos à prova. Também gosto de Gillian Flynn e Megan Abbott, ambas criam de forma brilhante personagens femininas complicadas e assustadoras.

Agora, mais do que nunca, os escritores estão a usar a ficção para explorar ideias e sentimentos complexos sobre o mundo em que vivemos

Como vê o estado atual da literatura?

Entusiasmante. Há uma grande variedade de livros a serem publicados neste momento – desde thrillers realmente inventivos e de ficção distópica, a uma linda e experimental literatura de ficção.E agora há também uma maior tendência para os romances mais peculiares.

A literatura está a mudar?

Os audiobooks, e-books e as editoras privadas são sinónimo de que há agora mais formas para escritores e editores fazerem chegar o seu trabalho a novos leitores e isso é uma coisa boa. Acho também que agora, mais do que nunca, os escritores estão a usar a ficção para explorar ideias e sentimentos complexos sobre o mundo em que vivemos.

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