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"Os grandes promotores diziam que íamos destruir o mercado. Foi o oposto"

Roberta Medina mostra-se agradada com o impacto que o turismo tem tido em Portugal nos últimos anos e revela neste Vozes aos Minuto os concertos a que mais gostou de ver e aqueles que não teve oportunidade de assistir.

"Os grandes promotores diziam que íamos destruir o mercado. Foi o oposto"
Notícias ao Minuto

14:20 - 22/06/18 por Fábio Nunes

Cultura Roberta Medina

Portugal tem vivido momentos distintos nos últimos 14 anos. Passou de uma situação mais negativa e que exigiu sacrifícios aos portugueses durante a Troika a uma situação mais otimista nesta altura, com a economia a melhorar aos poucos impulsionada principalmente pelo turismo.

Roberta Medina é sincera. A decisão de trazer o Rock in Rio para Lisboa não se deveu a um vislumbre do potencial que o mercado português tem agora. "Foi uma coincidência de encontros”, diz. Uma aposta ganha e que agora tem o retorno do crescimento do turismo e da dimensão de Portugal a nível externo.

A empresária falou com o Notícias ao Minuto sobre os concertos que mais a marcaram. Uma escolha que não foi fácil. Mas também sobre Frank Sinatra e Freddie Mercury, as duas lendas da música que não chegou a ver em palco.

A situação no Brasil também foi um dos tópicos desta conversa.

Quando se realizou o primeiro Rock in Rio em 2004, Lisboa ainda não era, como é hoje, um destino turístico de excelência, com muitas empresas a abrirem escritórios em Portugal. Quando tomaram a decisão de vir para cá já anteviam o potencial do mercado português?

Não. Era bonito dizer que sim, não é? Mas não (risos). Era bom. 15 anos… haja visão! A decisão de vir para Portugal foi o destino mesmo. Foi uma coincidência de encontros, de pessoas que se apaixonaram pelo festival e começaram a procurar-nos para trazer o festival para cá. De ter acontecido o 11 de Setembro em Nova Iorque e inviabilizar o contrato que estava ser fechado com a American Airlines para voltar a fazer o Rock in Rio no Brasil pela 4ª edição. Criou-se um espaço em que quem veio de Portugal a procurar-nos, nós já não tínhamos aquele projeto para fazer. Então viemos cá e as coisas fluíram com uma velocidade absolutamente incrível. Olhando para trás, o Rock in Rio foi uma cereja para Portugal e continua a ser como todos os projetos que acontecem em Portugal e nesta cidade porque gera emprego e impacto económico. A questão é que agora Lisboa de facto é uma grande cereja para nós. Não é um esforço de uma parte só, a onda vai daqui para lá e de lá para cá.

Quando chegámos, os grandes promotores diziam que íamos destruir o mercado. Mas foi o oposto e nós não sabíamos que isto ia acontecer

Se bem que no caso dos festivais nem sempre é determinante haver um grande fluxo de turismo ou não.

E no nosso caso nem é. O nosso público maioritariamente é nacional.

Mas como é que tem acompanhado este destaque que Portugal passou a ter a nível internacional. Cada vez vêm mais pessoas e cada vez realizam-se mais eventos no país.

Eu acho incrível. Eu lembro-me quando chegámos, os grandes promotores diziam que íamos destruir o mercado. Mas foi o oposto e nós não sabíamos que isto ia acontecer. Surgiu um novo modelo de negócio que atraiu investimento de marcas, que mostrou para outro tipo de consumidor que aquele produto aperfeiçoado podia ser interessante para ele também. Com mais infraestrutura, mais qualidade de entrega, para um público mais velho, para crianças, com mais segurança. Entrega um produto diferenciado aos públicos que não sejam jovens que gostam de pó e de confusão e outras pessoas passaram a interessar-se e efetivamente o mercado ficou muito maior. Além disso, acho que há uma apetência, um movimento natural dos portugueses que têm paixão pela música, de se interessarem, porque o Rock in Rio foi só um provocador. O que aconteceu com o mercado é que há muitos promotores e pessoas competentes que souberam olhar para isto, viram novas oportunidades e novos caminhos e construiram produtos relevantes nessa direção. Isto somando-se ao trabalho que a cidade e o país têm vindo a fazer em termos de turismo. São muitos movimentos que têm construindo o que acontece hoje.

No caso do Rock in Rio, o nosso público foi sempre muito nacional. O que começámos a fazer no momento em que o turismo começou a ganhar dimensão, foi olhar para esse segmento e começar a comunicar de forma específica com os países de onde vêm mais turistas para Portugal e apresentar a proposta do Rock in Rio como uma opção.

É difícil categorizar a música. Está muito claro que por vezes não é o estilo musical, é a dimensão que estes movimentos têm que conta

A música está em constante evolução. Hoje em dia as pessoas têm uma grande facilidade de acesso à música. Como tem seguido esta evolução?

Eu acho que cada plataforma coloca-se de forma diferente. Quando surge uma rádio como a Vodafone FM, ela tem uma proposta e procura determinado perfil de música e trabalha determinado perfil de música. O que é muito engraçado na música alternativa é que basta muitas pessoas ouvirem-na que rapidamente sai deste género. É difícil categorizar a música. Está muito claro que por vezes não é o estilo musical, é a dimensão que estes movimentos têm que conta. No caso do Rock in Rio é um projeto mainstream, pop rock. Ele vai procurar o que está em voga dentro daquilo que se propõe a fazer. O Super Bock Super Bock fez uma opção de ser mais jovem, o hip-hop passou a ser uma aposta mais forte. O que a variedade traz é mais opções de diálogo. No Brasil o que toca mais é música sertaneja e axé, mas as rádios de pop rock não passam estas músicas e os festivais também não.

Eu acho que os estilos não são importantes. O caminho que a sociedade está a seguir em termos de discussão é que não se é negro, se é branco, se é chinês, se é japonês, brasileiro, português, se é transsexual, mulher, homem. Isso não importa. Há uma coerência de curadoria. Se não gosto de um determinado estilo de comportamento ou de desporto, eu não me meto nisso. Mas isso é para qualquer coisa. Nós vamos criando as nossas comunidades por identificação de gosto. Há espaço para tudo e cada comunidade constrói-se de uma forma. Um evento com a dimensão do Rock in Rio vai para apostas mais consolidadas. O Alive tem um palco com apostas mais consolidadas e tem um palco para um público mais alternativo. Cada um apresenta o que o seu público gosta de ver. O Rock in Rio evoluiu mas o seu propósito é o mesmo, o de criar uma sociedade mais harmónica com estilos diferentes, com gostos diferentes. Na primeira edição houve jazz, samba, rock’n’roll, heavy metal, aquilo foi a salada mais mista de todas.

Quem cria um projeto tem uma motivação, mesmo que seja puramente comercial e o que é fundamental é que essa motivação não seja esquecida de maneira nenhuma.

Cresci com o Frank Sinatra a tocar na minha casa. Sou obcecada por várias músicas. Acho profundo, acho envolvente, acho que ele tinha uma voz incrível

Qual é que foi o concerto a que mais gostou de assistir?

Difícil. Muitos dos concertos a que quero assistir não consigo. Um dos melhores concertos a que assisti e com que fiquei muito impressionada, porque nunca tinha visto um concerto deles, foi Bon Jovi, aqui em 2006. É inacreditável a energia daquele grupo. Eles não pararam um minuto. Era um sucesso atrás do outro. As pessoas não paravam quietas e como eu não tinha visto um espetáculo deles fiquei muito impressionada. Mas já são muitos. É difícil. Alguns dos espetáculos mais marcantes no Rock in Rio eu não vi. Mas Bruce Springsteen foi dos concertos mais marcantes do Rock in Rio. Aqui e no Brasil foi brutal. Eu sou suspeita porque dos poucos concertos que vejo sempre é dos Xutos e é dos momentos mais bonitos da Bela Vista. O concerto dos D.A.M.A em 2016 foi absolutamente incrível. Eu não vi o concerto todo, eu só soube dos momentos mais bonitos depois, mas fiquei muito feliz com aquele dia porque era um público muito familiar. O dia que eu mais gosto na Cidade do Rock. Quando há muitas famílias juntas, eu acho a energia mais bacana, mais leve. Então aquele dia foi muito especial. Justin Timberlake aqui também foi incrível. Os concertos dos Metallica nas várias edições… É a minha 17ª edição. Não vale, não é justo.

Notícias ao MinutoRoberto Medina admite que não consegue assistir a muitos dos concertos que gostava© Rock in Rio

Se o tempo não fosse um fator, que cantor ou banda gostava de ver ao vivo que não tenha tido oportunidade de ver?

Eu ia desmaiar. Não sei se respondo sinceramente ou se invento… Frank Sinatra. Foi fácil.

Mas porquê?

O meu pai fez o maior espetáculo da vida do Frank Sinatra em 1980 no Maracanã. Eu cresci com o Frank Sinatra a tocar na minha casa. Sou obcecada por várias músicas. Acho profundo, acho envolvente, acho que ele tinha uma voz incrível. Tudo. Das letras à performance dele, a ele. É absolutamente contagiante. Falando de uma coisa muito especial, seria ele. Obviamente se olhar para o cenário do Rock in Rio, seria Freddie Mercury. Também é outro momento marcante porque eu tinha sete anos e não vi. Já estava por lá e não vi e tudo o que diziam é que era dos espetáculos mais incríveis de sempre. Mas a minha vivência foi muito mais de Sinatra do que de Freddie Mercury, era o que tocava mais na minha casa. Então cresci com isso. ‘Não acredito que não assisti a esse concerto’. Logo este. Tinha dois anos.

Brasil? Há um assalto às possibilidades do país todos os dias. As pessoas ficam na miséria porque é um assalto diário e um egoísmo soberano que acontece naquele país

A greve dos camionistas provocou o caos no Brasil. O país não consegue sacudir a instabilidade política e as suspeitas de corrupção ao mais alto nível há vários anos.

Suspeitas? Era bom se fossem só suspeitas.

Acredita que há uma luz ao fundo do túnel para o Brasil?

Na verdade acredito, porque se fosse para não sair nada disso estava a ser falado e discutido neste momento. Eu estou a seguir à distância. Não fiquei sem comida no frigorífico, não fiquei sem poder sair de casa como a minha família ficou e os meus amigos ficaram. O que eu vejo à distância é um bom sinal para os políticos pararem de apoiar lobbies. Porque há muitos anos que estão apoiar os lobbies rodoviários. Um país daquela dimensão não tem rede ferroviária e não tem alternativa. É absolutamente ridículo. Passou da incompetência. Não se trata disso porque se há coisa que o Brasil tem é dinheiro, é riqueza. É incompetência na tomada de decisões e há um buraco negro, um ralo gigante de corrupção. Há um assalto às possibilidades do país todos os dias. As pessoas ficam na miséria porque é um assalto diário e um egoísmo soberano que acontece naquele país. E não estou a falar deles apenas, falo de mim. É cultural. Não são só os políticos. Eles são o reflexo do que nós somos.

Temos de mudar a mentalidade e o motivo pelo qual acho que temos uma luz ao fundo do túnel é porque se não fosse esse o caso não estava a haver esta ‘baixaria’ toda. Vemos na capa dos jornais as coisas mais feias, que se dissessem que aquilo aconteceu numa casa de banho entre duas pessoas já seria feio. Está na capa dos jornais há três anos e nós a ver aquilo. É um processo de reflexão. O problema do Brasil neste momento é que o sistema é muito viciado. As pessoas que cogitam entrar na liderança política e que não fazem parte deste sistema, têm pouca crença de que o podem mudar. Geralmente, são engolidos pelo sistema. Então essas pessoas têm de ceder ao sistema para poder fazer algumas coisas e essa descrença é o maior problema do Brasil neste momento. Não tem liderança a querer assumir o barco. Só liderança ruim. Não tem ninguém novo, que não esteja viciado para entrar na política. Era preciso tirar de lá todos e pôr lá pessoas novas. Isso não vai resolver se não mudarmos a nossa mentalidade. Para mudarmos a nossa mentalidade é preciso investir em educação e ter mais respeito pelas pessoas. Temos de começar por algum lugar e a única forma de o fazer é arranjar uns malucos que resolvam ir para lá e tomem decisões importantes de investimento na educação e na mudança de mentalidades.

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