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Pedro Matos, o português por detrás do título mundial de Hauger na F3

Pedro Matos foi um dos rostos do sucesso da Prema na Fórmula 3, ajudou Dennis Hauger a tornar-se campeão do mundo e falou de toda a sua época, em exclusivo, com o Auto ao Minuto.

Pedro Matos, o português por detrás do título mundial de Hauger na F3
Notícias ao Minuto

08:29 - 22/10/21 por Ruben Valente

Auto Fórmula 3

Dennis Hauger tornou-se em 2021 campeão mundial de Fórmula 3, um dos campeonatos que serve de antecâmara à Fórmula 1. O jovem norueguês, da Academia da Red Bull, representou as cores da Prema durante este ano e teve como grande 'parceiro' Pedro Matos.

O nome talvez não lhe diga muito, mas se acompanhou o Mundial de Fórmula 3, provavelmente sabe de quem falamos. Pedro Matos é português e engenheiro de corrida na Prema, foi ele um dos elementos da equipa italiana que ajudou Hauger na conquista do título. Sim, porque dentro do carro só cabe o piloto, mas há tanto, tanto trabalho fora das pistas. É o próprio até quem o afirma numa entrevista exclusiva ao Auto ao Minuto.

Vizinho do antigo piloto de Fórmula 1, Tiago Monteiro, por mera coincidência, Pedro Matos quis outrora ser piloto profissional. Os custos que isso implica mudaram-lhe o sonho, que sempre foi estar ligado ao desporto motorizado. Quando percebeu que o sonho podia ganhar asas fora de um carro, Pedro fez as malas e foi para Inglaterra estudar. Hoje é engenheiro de corrida numa das melhores equipas nas Fórmulas de promoção - que antecedem a F1 - e não podia estar mais feliz, particularmente após mais um ano de conquistas pessoais e coletivas.

Mudei-me com 18 anos e estudei ‘motorsport engineering’ na Universidade de Oxford Brookes. A partir daí tive a certeza de que não queria fazer mais nada a não ser istoComo começou o teu percurso no automobilismo?

Desde que me lembro, este gosto partiu do meu pai. Ele, participou no Campeonato Nacional de Clássicos, fazia também ralis, por isso desde muito pequeno a minha paixão partiu daí. Tenho um irmão mais novo e começámos nos karts, mas a paixão sempre foi mais ligada à condução e a ideia passou sempre mais por ter uma carreira como piloto.

O gosto pela engenharia só surgiu graças ao teu amor pela competição automóvel?

Na altura, o meu pensamento foi algo deste género: ‘Bem, a minha carreira de piloto vai ser difícil’. Cheguei a ter algum sucesso e corri inclusivamente na Fórmula Ford, em Inglaterra. Depois disso, os preços para competir começarem a ser demasiado elevados e nós não tínhamos os apoios necessários. Tinha 18 anos e era preciso decidir o que gostava de seguir. ‘Não gosto de mais nada a não ser carros’, pensei eu. Então passou-me pela cabeça utilizar todos aqueles anos de experiência em corridas e canalizá-los para algum lado. Foi aí que decidi ir para Inglaterra. Mudei-me com 18 anos e estudei ‘motorsport engineering’ [engenharia de desporto motorizado] na Universidade de Oxford Brookes. A partir daí tive a certeza de que não queria fazer mais nada a não ser isto.

Um engenheiro de corrida é o responsável pela performance em específico do carro com que trabalha. Do carro e do pilotoAcabaste o curso e quais foram os teus primeiros passos na área?

Foram quatro anos de curso, mas houve uma altura em que voltei para Portugal porque tinha um ano de estágio. Trabalhei na Ocean Racing Technology, a equipa do Tiago Monteiro e do José Guedes, a quem agradeço muito a oportunidade, que me abriu imensas portas. Nesse ano, trabalhava na fábrica e seguia o trabalho de outros engenheiros. Estava a aprender, basicamente. Entretanto, a equipa fechou e vi-me numa situação complicada porque não iria conseguir completar o meu estágio. Tinha de arranjar uma solução rápida e fui para a Alemanha, onde trabalhei numa equipa de GT3. Acabei o curso depois, em 2014.

Estás atualmente na Fórmula 3, uma das antecâmaras da F1, e logo numa das equipas que tem vencido tudo na categoria. Como é que chegaste à Prema?

Esta foi a minha terceira época na Prema. Depois do curso finalizado, fiquei em Inglaterra a trabalhar como engenheiro de ‘data’. ‘Performance engineer’, é o nome mais correto, numa equipa de GP2, a atual Fórmula 2, que era a Caterham. Não era uma posição tão responsável, talvez, como a que estou hoje. Trabalhei depois na ARDEN, onde fiquei cerca de cinco anos, e foi lá que me comecei a interessar mais pelo ‘race engineering’ [engenharia de corrida]. Eles tinham uma equipa de Fórmula 4 e foi por onde comecei. Passou-me pelas mãos o Oscar Piastri, que neste momento é o líder do Mundial de Fórmula 2. A primeira época de monolugares dele foi comigo. A primeira época do Dennis Hauger também foi comigo. Foi aí que comecei a desenvolver mais essa paixão.

O que faz um engenheiro de corrida? Pode dizer-se que é o principal elo de ligação entre o piloto e a equipa?

Na Fórmula 3, só há um engenheiro por carro. Na Fórmula 2 é que existe um engenheiro de corrida e um engenheiro de ‘data’, que é resumidamente um ajudante do engenheiro de corrida. O engenheiro de corrida é o responsável pela performance em específico do carro com que trabalha. Do carro e do piloto. E como disseste, acaba por ser a ligação entre a equipa e o piloto, mas o objetivo principal da função é extrair o máximo de performance da combinação entre piloto e carro.

O teu grande objetivo é fazeres com que o carro esteja o mais rápido e ‘conduzível’ possível para o piloto com o qual trabalhas?

Sim, de uma maneira muito resumida, sim. A Prema tem três carros e nós, engenheiros, trabalhamos todos em conjunto. Durante as sessões de treinos, a discussão é feita num âmbito geral e, se o problema for comum entre os três pilotos, acertamos o setup inicial. No entanto, tudo o que seja problemas mais particulares que o Dennis tenha, lá está… aí sou eu que tenho essa responsabilidade e a última palavra.

O facto de cada piloto dar o seu feedback ao engenheiro de corrida e ter afinações e 'setups' mais pessoais faz com que os carros acabem por ser ligeiramente diferentes, mesmo sendo da mesma equipa?

Sim, mas depende das equipas. Na Prema trabalhamos muito em conjunto e tentamos dar as mesmas condições aos três pilotos. O resto, claro, depende sempre da comunicação com o piloto, da maneira como preparamos a corrida no simulador… Depois, onde acho que ganho com a experiência que tive como piloto é na forma como se comunica com o piloto, a linguagem. Estamos ali a ver dados de vários sensores, aí é onde a ligação entre piloto e engenheiro funciona bem. É preciso entender da melhor forma o piloto para saber o que é que ele precisa para controlar melhor o carro ou para ser mais rápido.

O Dennis [Hauger] vinha dos karts como sendo uma promessa tipo Max VerstappenQuem segue o Mundial de Fórmula 3 vê-te habitualmente de sexta-feira a domingo a trabalhar. Mas além do que vemos de fora, há certamente mais trabalho para um engenheiro. Certo?

Sem dúvida. A minha função é um bocado dividida entre os três engenheiros mas, de uma maneira muito básica, nós temos de dar aos mecânicos a lista de trabalho a fazer no carro entre um fim de semana e outro. Fazemos a preparação do evento a seguir, fazemos vários relatórios de análise ao evento precedente, e uma das minhas funções também é fazer relatórios e trabalhos de simulação de 'setup' do carro para a próxima corrida. Na fábrica da Prema temos também sessões de simulador com os pilotos para os preparar da melhor forma para as corridas do fim de semana seguinte. Temos tão pouco tempo de pista na Fórmula 3 e Fórmula 2 que o trabalho fora dela é crucial.

Há então mais trabalho fora do fim de semana de corrida do que propriamente de sexta a domingo.

Com toda a certeza.

A Prema tem dominado as Fórmulas de promoção, a F2 e a F3. Tu que fazes parte da equipa consegues dizer-nos qual o segredo para estar sempre no topo?

Muita gente pergunta isso, mas acho que não há assim muita coisa por revelar. Para além do óbvio, que é a qualidade de todos os elementos da equipa, dos mecânicos aos pilotos, a maior diferença que vejo é a paixão que todos temos por ganhar, a vontade de dar tudo para que corra tudo bem ao final do dia. Trabalhamos todos de uma forma muito próxima e em conjunto, algo que se calhar não ocorre noutras equipas. Acho que estes componentes juntos fazem com que os resultados sejam melhores ou, pelo menos, consistentemente bons. É um bocadinho a mentalidade italiana, porque a equipa é de Itália. Há uma componente mais familiar, não existe o trabalho de um, existe o trabalho de todos. Quando assim é, acho que se atinge mais sucesso.

Notícias ao Minuto Dennis Hauger e Pedro Matos a festejar a vitória na corrida 3 de Barcelona© Getty Images

Como foi este ano de trabalho com o Dennis Hauger? Foi dos melhores pilotos com quem já trabalhaste?

Sim, já tinha trabalhado com ele na F4 - na Arden. O Dennis vinha dos karts como sendo uma promessa tipo Max Verstappen, na altura. Sempre foi dos pilotos com quem já trabalhei que mais sobressaiu devido ao seu talento natural. Acabámos por nos reencontrar no fim do ano passado depois de um ano bastante mau para ele na Fórmula 3. O trabalho passou principalmente por lhe dar a confiança que faltava. Ele precisava de voltar a acreditar nas capacidades dele. O trabalho de um engenheiro de corrida passa também, muitas vezes, pela parte psicológica e mental do piloto. Uma pequena vantagem que tinha era o facto de já o conhecer. A nossa relação sempre foi boa, e sempre houve uma confiança mútua. Desde os testes de inverno que conseguimos ver as áreas em que ele precisava de melhorar. Sempre lhe disse que se conseguíssemos trabalhar na parte psicológica, o talento natural dele ia fazer o resto.

Até onde é que ele pode chegar?

Acho que pode chegar à Fórmula 1, sem dúvida. Falta o passo final, digamos assim, que é a Fórmula 2. Acho que ele tem a sorte, ou o azar, de estar no programa de jovens pilotos da Red Bull, que como é sabido é um bocadinho cru com os pilotos. Acho que tem todas as capacidades para lá chegar. Só precisa dos resultados que as capacidades dele lhe permitem. Por isso, não me admirava nada que daqui a dois ou três anos víssemos o Dennis Hauger na Fórmula 1.

Notícias ao Minuto Pedro Matos - quarto a contar da esquerda - a festejar o título de Dennis Hauger na F3© Getty Images  

E o Oscar Piastri? Também trabalhaste com ele e há a possibilidade de chegar à F1 já no próximo ano.

Foi engraçado que apanhei os dois na mesma altura, na F4. Foi curioso ver a adaptação de ambos aos monolugares, depois de virem dos karts. Deu-me muito gosto trabalhar com os dois e tenho-os em muito boa conta. Se ele não chegar à F1 é um bocadinho injusto, mas as coisas são um pouco assim por vezes. Muita gente também critica o Guanyu Zhou por vir a ter a oportunidade em vez do Oscar, mas no início deste ano fui engenheiro dele na F3 Asia, onde ele ganhou o campeonato, e ele está muito perto de ter os pontos da Superlicença graças a esse campeonato. Este ano não está a fazer um tão bom trabalho como o Oscar, e de uma maneira geral também não será tão talentoso como o Oscar, mas todos os pilotos que chegam àquele nível são bons e têm capacidades.

Da grelha de pilotos atual da F1 trabalhaste com o Pierre Gasly. Como é que foi trabalhar com ele?

Não tinha, na altura, a mesma experiência e não tinha grande método de comparação, mas fiquei sempre com a sensação de que ele era muito empenhado. Desde cedo que era piloto da Red Bull e vi que havia ali alguma pressão para obter resultados. Acabei por fazer as suas primeiras corridas de Fórmula 2, na altura ainda era a GP2, impressionou-nos com a sua adaptação e pelo método profissional que já tinha com aquela idade.

E quais os teus planos para o futuro? Tal como os pilotos, ambicionas chegar à Fórmula 1?

Quando trabalhei como engenheiro de 'data' na Fórmula 2 tinha mais essa ambição do que agora. Adoro o meu trabalho e gosto muito de estar na Prema. No entanto, é algo um pouco diferente da vida dos pilotos. Isto acaba por ser o meu trabalho, a minha profissão… E hoje em dia as equipas de F1 preferem trazer engenheiros que trabalham na equipa há bastantes anos, e que têm vindo a subir pelos vários departamentos, do que propriamente levar um engenheiro de Fórmula 2. Já aconteceu, mas é mais raro. Nesse sentido é diferente do caso dos pilotos.

Mas se o convite surgisse...

Acho que se a oportunidade surgisse, se fosse a oportunidade correta, gostaria muito de experimentar.

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