Durante mais de uma hora, Passos Coelho – que está na capital austríaca para uma visita de 24 horas - escutou críticas de cinco portugueses residentes na cidade e de outro que estuda na vizinha Eslovénia.
Os seis (todos nascidos depois de 1980) tencionavam aproveitar a presença de Passos Coelho em Viena para expressar o seu descontentamento com a situação económica e social de Portugal, como tem ocorrido com frequência nos últimos dias nas intervenções públicas de vários governantes.
Na noite de quinta-feira, enquanto aguardavam que Passos Coelho saísse da Ópera de Viena (onde assistiu à ópera ‘Simão Bocanegra’, a convite do Governo austríaco), os seis jovens estavam indecisos entre cantar a música de Zeca Afonso ou desafiar o primeiro-ministro para uma conversa. Acabaram por escolher a segunda opção: “Queríamos convidá-lo para uma cerveja”, disseram por trás de um cordão policial.
Perante o nervosismo de assessores e seguranças, Passos Coelho não ignorou o pequeno grupo e dirigiu-se aos seis portugueses. Explicou-lhes que não podia conversar imediatamente com eles, porque tinha um jantar agendado com o chanceler austríaco: “Mas depois disso terei muito gosto em estar convosco”, disse.
Passos Coelho sugeriu-lhes que voltassem hora e meia mais tarde. Pelas 23h30 recebeu-os numa sala do hotel Sacher, no centro de Viena.
O diálogo durou mais de uma hora. No final, os membros do grupo disseram à agência Lusa do que tinham falado com Passos Coelho numa conversa “pessoal, directa”.
“Fiz algumas perguntas sobre a situação económica portuguesa. Falámos sobre o endividamento, o primeiro-ministro explicou-nos como é que os empréstimos aos bancos são feitos e como esse dinheiro há-de voltar aos cofres do Estado”, contou Miguel, engenheiro informático.
“Dissemos-lhe o que estávamos a fazer em Viena. Tentámos ligar as nossas experiências de vida, apoiar as nossas críticas nas nossas experiências sem usar frases feitas dos jornais”, explicou David, engenheiro de som.
O grupo confessou-se surpreendido pela atitude do primeiro-ministro. Diana, arquitecta, notou: “Não é muito normal [Passos Coelho] ter-nos convidado”.
Vasco, estudante, não esperava ter uma audiência com Passos Coelho, mas não ficou surpreendido com o seu discurso: “Só podia ter dito o que disse. Assim que entrámos naquela sala, o que se seguiu foi o que eu esperava”.
Miguel explicou a hospitalidade do chefe de Governo com uma questão estratégica, tendo em conta “o que tem acontecido nas últimas semanas em Portugal, com pessoas a interromper discursos na Assembleia da República e discursos do [ministro dos Assuntos Parlamentares Miguel] Relvas com o 'Grândola Vila Morena'”.
“Convém-lhe receber este pequeno grupo e dialogar. É a maneira de [Passos Coelho] poder também mostrar, 'ah somos superiores a esta gentinha que está para aqui a cantar umas músicas e a tentar revolucionar'”, acrescentou.
“Queria ter-lhe dito no fim que, na verdade, queríamos cantar o 'Grândola Vila Morena'”, contou David. “Mas ele, como bom político, deu-nos a volta e sentou-nos à mesa a beber chazinho”, observou.
Passos Coelho tem hoje reuniões de trabalho com o chanceler da Áustria, Werner Faymann, e com o Presidente federal, Heinz Fischer. Ao fim da tarde, o primeiro-ministro regressa a Lisboa.