“Um filho nunca substitui aquele que já se perdeu”
Paula Pereira tinha 24 anos e uma grande vontade de ser mãe. Há 18 anos engravidou e o futuro sorria-lhe. Não havia razões para preocupação, até ao dia em que o filho nasceu.
“Nunca me vou esquecer daquele dia”, disse Paula ao Notícias ao Minuto.
As contrações começaram naquele dia 7 de setembro de 1997. Paula foi para o hospital radiante, pois estava prestes a conhecer o bebé que gerara e carregara com tanto amor durante nove meses. Mas as enfermeiras aperceberam-se de que algo não estava bem, pois não conseguiam ouvir os batimentos cardíacos da criança.
“Levaram-me para uma sala de ecografias. A médica fez o exame e disse-me apenas: ‘Isto às vezes acontece. O seu filho está morto’. E foi-se embora”, relembrou entre lágrimas.
Passaram 18 anos, mas Paula garante que jamais esquecerá os momentos de dor que viveu no Hospital de Aveiro.
Aos 24 anos, Paula, escriturária de profissão, deu à luz um bebé sem vida na madrugada do dia 8 de setembro. “Não me deixaram pegá-lo ao colo, nem me deixaram vê-lo”, lamenta. A autópsia revelou que a causa da morte foi a placenta, que deixou de alimentar o bebé, uma situação que, explicaram-lhe, deveria ter sido detetada na última ecografia que fez antes de entrar em trabalho de parto – dois dias antes.
Em casa estava tudo preparado para a chegada do bebé, um menino. Mas Paula regressou ao seu lar sozinha, apenas com a companhia do marido, o seu “grande amigo”. A família, juntamente com o médico, havia decidido retirar da casa tudo o que pertencia ao bebé.
“Fiquei revoltada com aquela decisão. Eu tinha que enfrentar aquilo e obriguei-os a trazerem tudo de volta para onde estava”, afirmou.
Mas o sonho de ser mãe não se desvaneceu. Pouco mais de seis meses volvidos, Paula voltou a engravidar. “O meu marido ficou radiante. Mas eu chorei, chorei muito. Tinha muito medo que me voltasse a acontecer o mesmo”, recordou.
Seguiram-se 37 semanas de angústia, de receio, de temor. “Andava sempre com a mão na barriga para o sentir mexer”.
Desta vez correu tudo bem. Miguel nasceu no dia 30 de janeiro, saudável, sem problemas. Paula podia respirar de alívio. Mas não.
“Quando o meu filho tinha três, quatro anos, tive uma grande depressão. Bati mesmo no fundo”, contou, lembrando que perdeu bastante peso, que tinha dores por todo o corpo, até que finalmente diagnosticaram a depressão. Fez vários tratamentos, mas teve sempre uma recaída.
Atualmente está bem. Não voltou a ter uma recaída desde que terminou o último tratamento. Mas existem dias mais sombrios do que outros.
“O mês de setembro e o Natal mexem muito comigo. Quando ando mais em baixo o pensamento vai sempre para o meu filho”, confessou entre lágrimas, revelando que vai diversas vezes ao cemitério. “É um conforto espiritual”.
Quanto ao marido tem apenas elogios a tecer. “Ele foi um grande amigo, um grande apoio. Ajudou-me sempre. Eu fui abaixo muitas vezes e ele segurou-me sempre”, sublinhou.
O marido não gosta de falar do assunto e quando fala ainda se questiona: “Porque é que tinha que acontecer connosco?”.
Volvidos 18 anos, aquele triste dia 8 de setembro não foi esquecido. “O filho que se perde nunca é substituído por outro. Este ajuda a atenuar a dor da perda, mas não substitui. O tempo não cura tudo e a ferida nunca sara, mas cicatriza”, desabafa.
Paula não quis ter mais filhos. Não iria aguentar passar pela mesma angústia durante nove meses. O marido insistiu sempre, mas agora, aos 43 anos, Paula diz que vai esperar pelos netos.
“Nunca se esquece aquilo que era nosso e que perdemos para sempre”
Isidoro Alter casou aos 22 anos. Em 1977 a mulher deu à luz um nado morto. Foi uma perda sofrida, mas o casal não desistiu de tentar.
Dois anos depois nova gravidez, novo drama. A mulher de Isidoro deu à luz um menino. O primeiro susto havia passado, pois o bebé havia nascido com vida, mas infelizmente não viveu muito mais.
“Acabou por falecer 30 minutos depois. Tinha problemas cardíacos e nasceu com deficiências em todos os membros”, contou ao Notícias ao Minuto.
À dor de perder o primeiro filho somou-se a dor de perder o segundo. Foram momentos difíceis que o casal viveu.
A esperança já se tinha desvanecido e decidiram não tentar novamente. Mas em 1982 surgiu uma gravidez inesperada cujo final foi novamente dramático. “Nasceu em casa. Nem deu tempo de ir para a maternidade de Portalegre”, lembrou Isidoro, revelando que foi então que descobriram o motivo para os bebés não nascerem saudáveis ou já nascerem sem vida.
“Os médicos concluíram que o sangue da minha esposa não era compatível com o meu e, por isso, os bebés nasciam com mal formações congénitas”, recordou.
Os anos que se seguiram foram dramáticos. A dor de não poder ser pai atirou-o para o fundo do poço, levando-o a refugiar-se na bebida.
As coisas começaram a compor-se quando nasceu uma sobrinha. “Fui padrinho de batismo e ela veio para nossa casa e viveu connosco diariamente enquanto andou na escola até ao quarto ano, altura em que regressou a casa dos pais”, contou.
Depois nasceu uma nova sobrinha que cresceu também na casa de Isidoro, de onde saiu apenas quando passou a frequentar o 5.º ano escolar.
“E foi assim, com os sobrinhos, que colmatámos a falta dos nossos filhos. A minha afilhada tem agora um filho com sete anos e é como se fosse o nosso neto. Vamos à pesca juntos, jogamos à bola todos os domingos”, revelou, frisando que a filha o trata como “um pai adotivo”.
“No Dia do Pai ela dá uma prenda ao pai biológico e outra a mim e o mesmo acontece no Dia da Mãe. Somos uma família unida e entre todos conseguimos levar a vida em frente”, afirmou, revelando que entretanto teve que enfrentar um problema sério de saúde, um tumor na laringe.
Quanto à dor de perder um filho, Isidoro garante que é algo que “nunca se esquece”, apesar do amor que nutre pelas duas sobrinhas e do amor que as duas têm por si e pela sua esposa.
“Nunca se esquece aquilo que era nosso e que perdemos para sempre”, concluiu.