Meteorologia

  • 19 ABRIL 2024
Tempo
19º
MIN 15º MÁX 21º

Referendo de domingo revelou clivagem social até agora inédita

Um investigador de estudos eleitorais afirmou à Lusa que o referendo de domingo na Grécia revelou uma clivagem social nunca antes observada no país entre as zonas ricas e as regiões pobres.

Referendo de domingo revelou clivagem social até agora inédita
Notícias ao Minuto

15:54 - 07/07/15 por Lusa

Mundo Grécia

"A clivagem social é muito visível no referendo de domingo. Se formos a Kolonaki, um bairro rico de Atenas, houve 70 por cento de 'sim'. Nos bairros populares registou-se 75% de 'não', uma clivagem de uma amplitude nunca vista. Uma clivagem social, quase de classe, completa. A divisão no referendo foi uma divisão social", disse em declarações à Lusa em Atenas Ilias Nikolakopoulos, 67 anos, professor de Ciência política na universidade de Atenas, especialista em sociologia eleitoral e estudos de sondagens de opinião.

Os gregos rejeitaram no domingo, em referendo, por ampla maioria (61,34%) as propostas dos credores internacionais, (instituições europeias e Fundo Monetário Internacional), agravando o clima de incerteza na zona euro.

A fratura identificada pelo investigador também atravessou diversas forças políticas num contexto em que a generalidade das sondagens de opinião não previram uma distância final tão acentuada entre o 'não' e o 'sim', que teve 39% dos votos.

"Perto de 50% dos eleitores do Partido Comunista (KKE) votaram 'não' apesar do apelo à abstenção pela linha oficial. O boletim de voto especial que fizeram apenas foi seguido por 30,35% do seu eleitorado. Um boletim de voto que dizia não às duas propostas, podiam imprimi-lo na página da internet do partido e introduzi-lo nas urnas de voto. Apenas um em cada três eleitores do KKE fizeram a escolha do boletim alternativo", revela o também investigador em temas de história contemporânea da Grécia e um dos mais respeitados observadores políticos da realidade helénica.

"O eleitorado do partido de extrema-direita Aurora Dourada também se dividiu. Cerca de 75% votou 'não' e 25% votou 'sim'. É extraordinário. Há duas coletividades municipais onde o Aurora Dourada registou 15% nas eleições legislativas de janeiro. Uma situa-se no Peloponeso e caracteriza-se por uma tradição política de extrema-direita extrema. Aí, o 'sim' foi maioritário", prossegue na sua análise.

"Pelo contrário, há outra municipalidade no coração de Atenas onde o Aurora Dourada também obteve 15% e onde habitam as verdadeiras vítimas do memorando. O Aurora Dourada tem duas almas, a extrema-direita tradicional, tradição de batalhões de segurança durante a ocupação nazi, e a outra alma que são as camadas populares vítimas do memorando. Nesta última municipalidade, o 'não' teve 80%", revelou.

Ao analisar o comportamento do eleitorado dos três partidos que apoiaram o 'sim' no referendo de domingo sobre o acordo proposto pelos credores internacionais e rejeitado pelo Governo do partido da esquerda radical Syriza - a Nova Democracia (ND), Pasok e To Potami -, Ilias Nikolakopoulos também detetou flutuações eleitorais.

"O To Potami é, digamos, o mais "europeu". Mas 20% dos seus eleitores votaram 'não'. No Pasok foi semelhante, provavelmente mais de 20% dos eleitores do Pasok votaram 'não', e à volta de 15% dos eleitores da ND também votou 'não'".

Outro dado inédito nesta consulta destacado pelo académico foi o facto de ter decorrido com os bancos fechados, um "fator de medo" que não funcionou e que poderá garantir alguma vantagem ao primeiro-ministro Alexis Tsipras no recomeço das conversações com os credores e parceiros europeus.

"Continuo a pensar que um acordo entre a Grécia e as instituições europeias é inevitável, não há alternativa, mas vai ser feito na sequência de um confronto. Era quase necessário um confronto antes de se alcançar um acordo", assinala.

"Esperemos que não falhe de novo, o que também é possível. Mas o acordo continua a ser a melhor solução para as duas partes. Sabemos que as negociações na União Europeia (UE) são quase sempre conflituosas, mas a novidade é que esta situação de conflito passou pelo voto popular", sustenta.

Na perspetiva do académico, a tentativa em ultrapassar um conflito através de uma votação generalizada deverá implicar "uma reação muito dura das forças conservadoras. Porque fazer passar negociações europeias por um voto do povo é uma novidade".

Mas mais que o Governo, ou o partido Syriza que o apoia, o principal benefício político dos resultados da consulta de domingo terá sido recolhido pelo primeiro-ministro, sublinha o investigador.

"As consequências do referendo são a força não do Governo, mas do primeiro-ministro. Foi o primeiro-ministro Alexis Tsipras quem venceu este desafio. Poderia dizer-se que não foi um referendo mas antes um plebiscito, um referendo pessoal. O primeiro-ministro foi plebiscitado", sustentou.

Recomendados para si

;
Campo obrigatório