A deputada bloquista, Mariana Mortágua esteve à frente da Comissão Parlamentar de inquérito ao caso BES e numa altura em que já se apresentou a versão final do relatório, Mortágua não considera que tenha sido a má gestão no BES a levar ao colapso desta instituição.
E já é reconhecida lá fora pelas suas frases ‘arrojadas’ na comissão nomeadamente por aquela em que disse ao antigo presidente da PT, Zeinal Bava, que estava a ser amador.
“Lembro-me da do Bava. Estava a pensar: ‘Isto é um bocado amadorismo. Devia arranjar forma de dizer isto’”, relata, numa extensa entrevista ao Jornal de Negócios.
Para Mariana Mortágua, “se é para dizer, é para dizer. As coisas saem”. “Depois de dizer apercebi-me de que teve um impacto maior [do que tinha imaginado]. Toda a gente chamava Salgado o dono disto tudo, pelo menos nas costas; transformar aquilo em vítima disto tudo, não me surpreendeu”, explica, em relação ao momento em que caracterizou Salgado como vítima.
Neste momento, diz que o que mais lhe perguntam “na rua é o que é que vai acontecer a Salgado – se vai preso”. Pergunta para a qual não tem reposta.
Mortágua dá conta de que Salgado “estava falido há anos, se é que alguma vez esteve numa boa situação financeira. Parece aquelas crianças que fazem asneiras e se vão enredando num conjunto de mentiras para não admitir a asneira inicial que fizeram. O grupo nunca foi muito saudável, mas sempre havia um buraquinho”.
Quanto ao esquema usado pelo BES para esconder a real situação económica, a deputada explica que “ia-se buscar dinheiro à parte do grupo que estava a dar dinheiro para cobrir o prejuízo. Para que nunca ninguém soubesse que um banco com o nome Espírito Santo faliu ou teve um problema. Isto multiplicado por mil gera um processo que não se controla. Está sempre a explodir”.
“O maior erro que se pode fazer ao analisar o BES é achar que isto é culpa do Ricardo Salgado. Não faz sentido. Aí perdemos a análise estrutural do funcionamento da economia”, adianta.
Olhando para o sistema económico, Mariana Mortágua entende que “a maior mentira que se pode dizer às pessoas é que a banca é independente do poder político, e que o poder político pode gerir um país e uma economia sem tocar na banca. Isso não existe”.
“Não há nenhum Estado que não tenha de ter relação com o privado”, afirma.
Sobre a indignação das pessoas face ao colapso do BES, a deputada refere que “é legítimo procurar culpados para isto tudo. As pessoas que foram enganadas por aquilo que acham que Ricardo Salgado representa (a administração do BES e da família Espírito Santo) têm direito à indignação. E têm direito a querer justiça. As pessoas em Portugal estão um bocadinho sedentas dessa justiça”.
O dono disto tudo ou a vítima disto tudo, como dizia Mariana Mortágua na comissão, é visto pelos portugueses como o ‘culpado disto tudo’. “É natural que as pessoas personifiquem em Salgado o seu ódio contra o sistema. Essa justiça, quem pode fazer são os tribunais”, garante.
Durante os meses que esteve envolvida na comissão de inquérito, a deputada indica que colocou muitas vezes a questão se Ricardo Salgado era má pessoa, mas depois chegou à conclusão de que ele estava a tentar salvar o seu grupo e “esse era o bem maior”. “E se calhar na cabeça dele salvar o grupo significava salvar os clientes do banco. E isso era o bem maior a proteger, mesmo que implicasse alguns males pelo caminho”.
Por fim, comentou o facto de muitos dos envolvidos neste colapso se terem feito passar por ‘ingénuos’. “O que me espantou mais foi a forma como homens inteligentes preferiam uma estratégia que passava por passarem por não-inteligentes. ‘Não percebi a pergunta, não sei, não me lembro’. Mais vale passar por incapaz do que por mentiroso”, remata.