Vargas Llosa defende o espírito crítico da literatura
O escritor Mario Vargas Llosa alertou hoje para os perigos da "sociedade do espetáculo" que vivemos e a ditadura da tecnologia, tendo defendido uma literatura que "mantenha o espírito crítico, sem a qual desapareceria a liberdade".
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O escritor hispano-peruano falava na Reitoria da Universidade Nova de Lisboa, depois de ter recebido o grau de Doutor Honoris Cauda daquela instituição, apadrinhado por Francisco Pinto Balsemão, presidente do conselho geral da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, e proposto pelo poeta e catedrático Nuno Júdice, que fez o elogio académico.
"A literatura é um prazer, mas se for apenas isso, provavelmente empobrecia na sociedade algo de que depende, na sua essência, o progresso humano, que é o espírito crítico", afirmou Llosa.
"Nada nos ensina melhor que um livro", sublinhou.
Vargas Llosa afirmou que é de um tempo em que os escritores acreditavam na literatura como "arma eficaz para combater as injustiças, em que as palavras eram armas, como escreveu Jean-Paul Sartre, e com elas se podia influenciar a história e, como escreveu Arthur Rimbaud, mudar a vida".
Uma perspetiva de compromisso que parece "não interessar especialmente aos escritores mais jovens", a quem chama "pretensiosos", e para quem a literatura "é sobretudo uma forma de entretimento superior, porque é feita de sensibilidade e estimula a imaginação e, de alguma maneira, educa as pessoas".
Llosa afirmou que acredita que a literatura deve "combater eficazmente os demónios e os males que grassam numa sociedade".
"Desde logo que a literatura é uma forma de entretenimento", afirmou e referiu "os homens e mulheres que, depois de uma dura luta diária, procuram num livro uma forma de evasão", mas defendeu que a literatura não pode ser apenas isso, pois "o mundo em que vivemos é sempre insuficiente para satisfazer todos os nossos apetites e desejos", e que esta "insatisfação, este entendimento das imperfeições da realidade foi sempre o grande motor das transformação, da rebeldia, da mudança. Do progresso e do colocar em causa o statu quo".
O distinguido, que falou de improviso, referiu ainda que, se a literatura ficar apenas pelo entretenimento, e "não atiçar os nossos espíritos", a dimensão tecnológica que "George Orwell imaginou, num romance célebre, passaria de ficção a realidade".
Enfatizando a força da literatura, Llosa referiu a "desconfiança pertinaz e sistemática ao longo da história" de todos os regimes ditatoriais, que estabelecem "de imediato um regime de controlo e censura" das obras de ficção, "esse sistema tão benigno de contar histórias, que atiçam o coração humano".
"Se não fosse essa insatisfação, que a literatura alimenta, o homem nunca teria saído das cavernas e alcançado as estrelas", frisou.
Vargas Llosa, num discurso de pouco mais de 15 minutos, referiu os escritores James Joyce, Williian Faulkner, Leon Tolstói e José Cardoso Pires, de quem foi amigo e com quem conviveu na década de 1960, quando foi professor na Universidade de Londres.
Foi Cardoso Pires, afirmou o autor de "Conversas n'A Catedral" e "A Sociedade do Espetáculo", quem o fez descobrir Fernando Pessoa, um dos seus poetas favoritos, que relê, e "muitos autores portugueses".
À cerimónia, hoje, ao final da tarde, assistiram várias personalidades, designadamente o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, vários diplomatas, entre os quais o núncio apostólico, o ex-presidente da República Mário Soares, o ensaísta Eduardo Lourenço e os escritores Mário de Carvalho, Lídia Jorge, Francisco José Viegas, Inês Pedrosa e Leonor Xavier.
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